“Não há compra de votos"; “Marcos Valério não é troféu ou personagem para ser sacrificado em altar midiático”, "Foi vítima de implacável perseguição pela mídia, sem direito de defesa", afirmou o advogado de Valério.
BRASÍLIA-DF*: O rechaço às provas da
acusação, a negação da existência do mensalão e a admissão de caixa dois na
campanha do PT e partidos aliados em 2002 dominaram as sustentações dos
primeiros advogados a apresentarem a defesa dos réus no STF (Supremo Tribunal
Federal).
Nesta segunda-feira (6), apresentaram as
defesas os advogados de José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Marcos
Valério e Ramon Hollerbach. Após suas sustentações, os defensores apontaram a
falta de acusações da Procuradoria Geral da República para justificar o fato de
não terem utilizado o tempo regimental de uma hora a que tinham direito.
“O procurador-geral não traz um fato, um
ato do qual ele [José Genoino] tenha participado. Eu espero que a minha
sustentação possa influir de maneira positiva no voto dos ministros”,
disse Luiz Fernando Pacheco, advogado do ex-presidente do PT José Genoino.
José Luis de Oliveira Lima, advogado de
Dirceu, disse que "50 minutos foram suficientes” para a defesa e que seu cliente
ficou satisfeito com a sua sustenção. "Eu conversei com ele. Ele está
satisfeito", disse. "“Os autos comprovam a total improcedência das
colocações contra José Dirceu.”
Para Arnaldo Malheiros Filho, defensor do
ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, “a falta de carga acusatória"
permitiu que não usasse todo o tempo disponível. "Você não tem tantos
fatos a serem respondidos. Apesar de todos os volumes [do processo], se você
espreme, sai uma prova muito rala."
O julgamento foi suspenso por volta de
19h15 e será retomado amanhã, com as sustentações de outros advogados.
Veja abaixo os argumentos das defesas dos réus que
falaram hoje:
Sessão Plenária de julgamento da Ação Penal 470 (Mensalão), nesta segunda-feira (6/8) no STF, em Brasília-DF. |
JOSÉ DIRCEU
O Advogado José Luis de Oliveira Lima em defesa do ex-ministro José Dirceu. |
“José Dirceu não é chefe de quadrilha, não”, disse.
“Não há nos autos do processo nenhum depoimento, nenhuma testemunha, que faça
essa afirmação, de que José Dirceu, na [chefia da] Casa Civil, tenha
beneficiado qualquer instituição financeira”, afirmou Lima.
O advogado disse que o ex-deputado Roberto
Jefferson, delator do suposto esquema de compra de votos, “conseguiu fazer um
bom teatro”, ao acusar Dirceu de ter sido o mentor do esquema. “Roberto
Jefferson é um homem eloquente, um belo orador, que conseguiu fazer um bom
teatro. E por que fez um bom teatro? Todas as acusações que ele fez contra meu
cliente, a prova destruiu”, disse.
Lima afirmou que o Ministério Público Federal
(MPF) desprezou provas produzidas durante o contraditório, ou seja, com a
presença de um advogado. “Foram mais de 600 depoimentos e nenhum deles
incrimina José Dirceu”. E diz que a Procuradoria Geral da República se apoiou
em “provas extrajudiciais, em depoimentos tumultuados e em análises publicadas
na imprensa."
O advogado negou ainda a existência da “propalada
compra de votos” --que batizou o escândalo de mensalão. “Não existe prova dessa
acusação nos autos.”
JOSÉ GENOINO
O segundo a subir na tribuna foi o
advogado do ex-presidente do PT, José Genoino. Segundo Luiz Fernando Pacheco,
para a opinião pública, o mensalão foi uma farsa. “A opinião pública, há muito,
se convenceu que o mensalão foi uma farsa.”
Ao longo de sua sustentação, Pacheco
procurou convencer os ministros de que Genoino não tratava de questões
financeiras no interior do PT e era responsável pela articulação política com
outros partidos. “José Genoino não tem qualquer aptidão no tratamento com
finanças, mas, por ter anos no Congresso, é expert na articulação política”,
disse.
Para tentar comprovar sua tese, o
defensor citou depoimentos de petistas, como José Eduardo Cardozo, Maurício
Rands e Angelo Vanhoni, que, segundo Pacheco, confirmam a inabilidade de
Genoino no trato com as finanças.
Pacheco afirmou que os contratos
avalizados por Genoino foram legítimos. "Os dois contratos em que Genoino
foi avalista foram negociados e firmados com o conhecimento de toda a diretoria
do PT. São absolutamente legítimos, não são falsos como disse o
procurador-geral da República”, disse. "Foram firmados em 2003 quando o
Congresso Nacional quando não estava votando nada de importante. Portanto, não
têm nada a ver com o fantasioso e inventado mensalão", afirmou o advogado.
Sobre a acusação relativa ao PP, em que
os parlamentares Pedro Correa, Pedro Henry e José Janene teriam recebido
dinheiro em troca de apoio ao governo, o advogado de Genoino declarou: "a
acusação não disse quem teria dado dinheiro a quem, quando, onde, como, por
que, em que circunstâncias, absolutamente nada".
DELÚBIO SOARES
O advogado Malheiros Filho admitiu que o
PT fez "caixa dois" (uso de recursos financeiros não contabilizados e
não declarados aos órgãos de fiscalização competentes) durante a campanha
eleitoral de 2002. O defensor, no entanto, diz que os recursos auferidos
ilegalmente pela legenda não serviram para comprar parlamentares, negando,
dessa maneira, a existência do mensalão.
"O PT não podia fazer transferência
bancária porque o dinheiro era ilícito mesmo", afirmou. "Delúbio não
se furta a responder ao que é responsável. Ele operou caixa dois? Operou. É
ilícito? é? Ele não nega. Mas ele não corrompeu ninguém", disse o defensor
durante sustentação apresentada no STF mais cedo.
Malheiros Filho desqualificou as provas
apresentadas pela Procuradoria Geral da República contra o seu cliente e que,
segundo a acusação, provam a existência do esquema. "A prova é pífia, é esgarçada,
é rala”, disse,
Segundo ele, durante a campanha eleitoral
de 2002, os partidos da coligação que elegeu Lula se reuniram para estabelecer
como seria a divisão dos recursos da campanha.
Posteriormente, diz Malheiros Filho,
Delúbio foi incumbido de captar recursos para saldar as dívidas provenientes da
disputa eleitoral. “O diretório nacional do PT deliberou que iria arcar com as
despesas da base aliada”, disse.
O advogado negou que o ex-tesoureiro do
PT tenha buscado recursos de maneira ilegal para comprar parlamentares. “O
governo conquista sua base com a partilha do poder, não é com dinheiro.”
MARCOS VALÉRIO
O advogado Marcelo Leonardo, que faz a
defesa do publicitário Marcos Valério no julgamento do mensalão, afirmou nesta
segunda-feira (6) que seu cliente foi vítima de perseguição e linchamento
público depois que se tornaram públicas as acusações de participação dele no
mensalão.
“Marcos Valério não é troféu ou
personagem para ser sacrificado em altar midiático”, afirmou. "Foi vítima
de implacável perseguição pela mídia, sem direito de defesa", disse. Em
seguida, Leonardo disse que seu cliente chegou a ser "ridicularizado por
ter corte de cabelo zero". Segundo o advogado, a opção pela careca foi um
ato de solidariedade a um filho de Valério que teve câncer na época do
mensalão.
O advogado admitiu que Valério repassou
ilegalmente recursos ao PT para o financiamento da campanha eleitoral em 2002,
mas negou que o dinheiro tenha sido usado para comprar votos de parlamentares.
“Não há provas para a condenação de que a
finalidade dos repasses era para essa prática [de compra de votos]”, disse.
“Era sim para o pagamento de campanhas eleitorais, o que é crime eleitoral”,
afirmou Leonardo, admitindo a prática de caixa dois.
Leonardo começou sua sustentação
argumentando que não é possível imputar o crime de formação de quadrilha ao seu
cliente porque, nas empresas de Valério, não houve associação de pessoas para a
prática de crime. Ele disse que a empresa sempre teve atuação lícita, desde o
início da década de 80.
Quanto à acusação de corrupção ativa aos
quatro partidos políticos citados no caso, a defesa do publicitário alega
inocência, dizendo que corrupção ativa se refere à oferta de benefício a
servidor público, mas que os partidos não são órgãos públicos.
Sobre a acusação de que a agência de
Marcos Valério, SMP&B Comunicação, teria se beneficiado de licitação,
Marcelo Leonardo disse que era legal a licitação e que João Paulo Cunha,
ex-presidente da Câmara dos Deputados, não tinha qualquer influência sobre o
contrato, conforme alega a acusação.
"É fruto de criação mental do
acusador", disse Marcelo Leonardo, advogado de Marcos Valério, sobre a
acusação de corrupção no contrato publicitário da Câmara.
O advogado de Valério argumentou ainda
que não havia dinheiro público no fundo Visanet e que não há provas de desvios
de recursos públicos, o que sustenta a acusação.
No final de sua exposição, o advogado fez
um desabafo referindo-se à tensão do julgamento. "Tenho três minutos. Isso
parece tortura psicológica", afirmou.
RAMON HOLLERBACH
O último a falar foi Hermes Vilchez
Guerrero, advogado de Ramon Hollerbach, sócio de Marcos Valério na empresa DNA.
Ele disse que seu cliente teve a vida profissional destruída após as acusações
de participação no esquema.
"Ramon [Hollerbach] já teve a sua
vida profissional destruída, só não teve a vida pessoal destruída porque tem a
família ao seu lado. Foi acusado das piores coisas", disse o advogado.
Guerrero também afirmou que a falta de provas para condenar seu cliente.
"Se houve corrupção, e não há prova
disso, de onde é que o Ministério Público Federal extraiu que Marcos Valério
agia em nome de Ramon Hollerbach?", questionou. "Culpa não se
presume, culpa se demonstra."
O advogado diz ainda que seu cliente não
pode ser condenado por ter se associado a Valério. “Ramon Hollerbach Cardoso
não pode ser condenado por causa do CNPJ, mas por causa do seu CPF",
disse. "Nas milhares de folhas dos autos, não há um documento assinado em
nome da DNA”, afirmou.
Dia a dia do julgamento
O tamanho do processo mensalão, que foi empilhado em pastas no julgamento da AP 470/STF. |
Nos dias seguintes, os advogados dos 38
réus terão uma hora cada um para fazer a apresentação da defesa. A previsão é
que a primeira fase aconteça nos dias 2, 3, 6, 7, 8, 9,10, 13 e 14 de agosto.
Com duração de cinco horas, as sessões começarão sempre às 14h.
A última fase será destinada à leitura do
voto de cada um dos 11 ministros do STF, que irão revelar se absolvem ou
condenam os réus. Nesta etapa, as sessões devem ocorrer nos dias 15, 16, 20,
23, 27 e 30 de agosto, a partir das 14h, mas sem horário para terminar.
O primeiro a votar será o relator,
seguido do revisor do processo, o ministro Ricardo Lewandowski. A partir daí, a
votação segue por ordem inversa de antiguidade, da ministra Rosa Weber, a mais
nova na Corte, até o ministro decano, Celso de Mello. O último a votar será o
presidente do STF, ministro Ayres Britto.
Se o julgamento precisar se estender até
setembro, as datas das novas sessões deverão ser publicadas no Diário da
Justiça.
Entenda o mensalão
O caso do mensalão, denunciado em 2005, durante
o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus,
incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa
Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de
partido e antigos e atuais deputados federais.
O grupo é acusado de ter mantido um
suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a
parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo
empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo
federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos.
Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos
fraudulentos.
O tribunal vai analisar acusações
relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou
ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de
divisas e gestão fraudulenta.
*UOL -Brasília/Colaboraram Guilherme Balza e Janaina
Garcia, em São Paulo/Adaptações FN Café News.
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