A notícia de que a esposa do candidato José Serra, Mônica, “já fez um aborto” caiu como bomba neste sábado (16/10) em alguns jornais no Brasil. Segundo Sheila Canevacci Ribeiro, que é coreógrafa e ex-aluna da esposa do candidato do PSDB à presidência da República, ‘Mônica Serra decidiu abortar’, durante a Ditadura Militar no Brasil, ‘pois seu marido (Serra) estava exilado’ e “todos vivíamos uma situação instável”, confessou a esposa de Serra em uma aula para seus alunos na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Ao propalar boatos contra a candidata do PT, Dilma Rousseff, dizendo que ela seria favorável ao aborto, inclusive acusando-a de “matar criancinhas”, Serra e sua esposa devem, hoje, uma explicação ao eleitorado brasileiro, já que surge a informação de que a psicóloga Monica Serra também teria ceifado a vida de uma “criancinha”.
Numa paráfrase drummondiana (Carlos Drummond de Andrade), essa explicação enuncia assim: “E agora, José?”
Ao propalar boatos contra a candidata do PT, Dilma Rousseff, dizendo que ela seria favorável ao aborto, inclusive acusando-a de “matar criancinhas”, Serra e sua esposa devem, hoje, uma explicação ao eleitorado brasileiro, já que surge a informação de que a psicóloga Monica Serra também teria ceifado a vida de uma “criancinha”.
Numa paráfrase drummondiana (Carlos Drummond de Andrade), essa explicação enuncia assim: “E agora, José?”
Jornal Correio do Brasil - 13/10/2010 12:39, Redação, do Rio de Janeiro e São Paulo
O desempenho do presidenciável tucano, José Serra, no debate do último domingo pela TV Bandeirantes, foi a gota d’água para uma eleitora brasileira. O silêncio do candidato diante da reclamação formulada pela adversária, Dilma Rousseff (PT) – de que fora acusada pela mulher dele, a ex-bailarina e psicoterapeuta Sylvia Monica Allende Serra, de “matar criancinhas” –, causou indignação em Sheila Canevacci Ribeiro, a ponto de levá-la até sua página em uma rede social, onde escreveu um desabafo que tende a abalar o argumento do postulante ao Palácio do Planalto acerca do tema que divide o país, no segundo turno das eleições. A coreógrafa Sheila Ribeiro relata, em um depoimento emocionado, que a ex-professora do Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Monica Serra relatou às alunas da turma de 1992, em sala de aula, que foi levada a fazer um aborto “no quarto mês de gravidez”.
Em entrevista exclusiva ao Correio do Brasil, na noite desta segunda-feira, Sheila deixa claro que não era partidária de Dilma ou de Serra no primeiro turno: “Votei no Plínio (de Arruda Sampaio)”, declara. Da mesma forma, esclarece ser apenas uma eleitora, com cidadania brasileira e canadense, que repudiou o ambiente de hipocrisia conduzido pelo candidato da aliança de direita, ao criminalizar um procedimento cirúrgico a que milhões de brasileiras são levadas a realizar em algum momento da vida. Sheila, durante a entrevista, lembra que no Canadá este é um serviço prestado em clínicas e hospitais do Estado, como forma de evitar a morte das mulheres que precisam recorrer à medida “drástica e contundente”, como fez questão de frisar.
No texto, intitulado “Respeitemos a dor de Mônica Serra”, Sheila Ribeiro repete a pergunta de Dilma, que ficou sem resposta:
– Se uma mulher chega em um hospital doente, por ter feito um aborto clandestino, o Estado vai cuidar de sua saúde ou vai mandar prendê-la?
Leia o texto, na íntegra:
“Respeitemos a dor de Mônica Serra
“Meu nome é Sheila Ribeiro e trabalho como artista no Brasil. Sou bailarina e ex-estudante da Unicamp onde fui aluna de Mônica Serra.
“Aqui venho deixar a minha indignação no posicionamento escorregadio de José Serra, que no debate de ontem (domingo), fazia perguntas com o intuito de fazer sua campanha na réplica, não dialogando em nenhum momento com a candidata Dilma Roussef.
“Achei impressionante que o candidato Serra evita tocar no assunto da descriminalização do aborto, evitando assim falar de saúde pública e de respeitar tantas mulheres, começando pela sua própria mulher. Sim, Mônica Serra já fez um aborto e sou solidária à sua dor.
“Com todo respeito que devo a essa minha professora, gostaria de revelar publicamente que muitas de nossas aulas foram regadas a discussões sobre o aborto, sobre o seu aborto traumático. Mônica Serra fez um aborto. Na época da ditadura, grávida de quatro meses, Mônica Serra decidiu abortar, pois que seu marido estava exilado e todos vivíamos uma situação instável. Aqui está a prova de que o aborto é uma situação terrível, triste, para a mulher e para o casal, e por isso não deve ser crime, pois tantas são as situações complexas que levam uma mulher a passar por essa situação difícil. Ninguém gosta de fazer um aborto, assim como o casal Serra imagino não ter gostado. A educação sobre a contracepção deve ser máxima para que evitemos essa dor para a mulher e para o Estado.
“Assim, repito a pergunta corajosa de minha presidente, Dilma Roussef, que enfrenta a saúde pública cara a cara com ela: se uma mulher chega em um hospital doente, por ter feito um aborto clandestino, o Estado vai cuidar de sua saúde ou vai mandar prendê-la?
“Nesse sentido, devemos prender Mônica Serra caso seu marido seja eleito presidente?
“Pelo Brasil solidário e transparente que quero, sem ameaças, sem desmerecimento da fala do outro, com diálogo e pelo respeito à dor calada de Mônica Serra,
“VOTO DILMA”, registra, em letras maiúsculas, no texto publicado em sua página no Facebook, nesta segunda-feira, às 10h24.
Reflexão
Diante da imediata repercussão de suas palavras, Sheila acrescentou em sua página um comentário no qual afirma ser favorável “à privacidade das pessoas”.
“Inclusive da minha. Quando uma pessoa é um personagem público, ela representa muitas coisas. Escrevi uma reflexão, depois de assistir a um debate televisivo onde a figura simbólica de Mõnica Serra surgiu. Ali uma incongruência: a pessoa que lutou na ditadura e que foi vítima de repressão como mulher (com evento trágico naquele caso, pois que nem sempre o aborto é trágico quando é legalizado e normalizado) versus a mulher que luta contra a descriminalização do aborto com as frases clássicas do “estão matando as criancinhas”. Quem a Mônica Serra estaria escolhendo ser enquanto pessoa simbólica? Se é que tem escolha – foi minha pergunta.
“Muitas pessoas públicas servem-se de suas histórias como bandeiras pelos direitos humanos ou, ainda, ficam quietas quando não querem usá-las. Por isso escrevi ‘respeitemos a dor’. Para mim é: respeitemos que muita gente já lutou pra que o voto existisse e que para que cada um pudesse votar, inclusive nulo; muita monica-serra-pessoa já sofreu no Brasil e em outros países na repressão para que outras mulheres pudessem escolher o que fazer com seus corpos e muitas monicas-serras simbólicas já impediram que o aborto fosse descriminalizado.
“Muitas pessoas já foram lapidadas em praça pública por adultério e muitas outras lutaram pra que a sexualidade de cada um seja algo de direito. A minha questão é: uma pessoa que é lapidada em praça pública não faz campanha pela lapidação, então respeitemos sua dor, algo está errado. Se uma pessoa pública conta em público que foi lapidada, que foi vítima, que foi torturada, que sofreu, por motivos de repressão, esse assunto deve ser respeitadíssimo.
“Vinte por cento da população fazem abortos e esses 20% tem o direito absoluto de ter sua privacidade, no entanto quando decidem mostrar-se publicamente não entendo que estes assimilem-se ao repressor”, acrescentou a ex-aluna de Monica Serra, que teria relatado a experiência, traumática, às alunas da turma de 1992.
Exílio e ditadura
Sheila diz ainda, em seu depoimento, que “muitas pessoas querem ‘explicações” para o fato de ela declarar, publicamente, o que a ex-professora disse às suas alunas na Unicamp.
“Eu sou apenas uma pessoa, uma mulher, uma cidadã que viu um debate e que se assustou, se indignou e colocou seu ponto de vista na internet. Ao ver Dilma dizendo que Mônica falou algo sobre ‘matar criancinhas’, duvidei.
“Duvidei porque fui sua aluna e compartilhei do que ela contou, publicamente (que havia feito um aborto), em sala de aula. Eu me disse que uma pessoa que divide sua dor sobre o aborto, sobre o exílio e sobre a ditadura, não diria nunca uma atrocidade dessas, mesmo sendo da oposição. Essa afirmação de ‘criancinhas assassinadas’ é do nível do ‘comunista come criancinha’. A Mônica Serra é mais classe do que isso (e, aliás, gosto muito dela, apesar do Serra não ser meu candidato).
“Por isso, deixei claro o meu posicionamento que o aborto não pode ser considerado um crime – como não é na Itália, na França e em outros países. Nesse sentido não quero ser usada como uma ‘denunciadora de um ‘delito’. Ao contrário, estou relembrando na internet, aos meus amigos de FB (Facebook), que o aborto é uma questão complexa que envolve a todos e que, como nos países decentes, não pode ser considerado um crime – mas deve ser enfrentado como assunto de saúde.
“O Brasil tem muitos assuntos a serem tratados, vamos tratá-los com o carinho e com a delicadeza que merece.
“Agora volto ao meu trabalho”, conclui Sheila o seu relato na página da rede social.
“Serra e sua mulher devem à ‘platéia’ uma explicação
Blogs da Folha/ Josias de Souza: “Nos Bastidores do Poder”
16/10/2010
Deve-se considerar a opção religiosa e a intimidade de alguém no momento da escolha de um chefe de Estado? Pensando melhor, adie-se a pergunta.
Comece-se de outro modo: o debate beato que tomou conta da cena eleitoral injetou em 2010 um quê de inquisição.
Serra viu na dubiedade de Dilma uma avenida de oportunidades. Chamou-a de “duas caras”.
Ontem incrédula, hoje cristã. Antes pró-descriminalização do aborto, agora contra.
Súbito, Monica Serra, a mulher do candidato tucano, mirou abaixo da linha da cintura.
Há um mês, num evento de campanha realizado na Baixada Fluminense, Monica disse que Dilma é a favor de “matar criancinhas”.
Veiculada pela ‘Agência Estado’, a frase de Monica não foi desmentida. Dilma esfregou a declaração na face de Serra.
Deu-se no debate de domingo passado. Serra poderia ter ecoado a mulher. Poderia também tê-la desdito. Preferiu o silêncio.
Mal comparando, o lero-lero da morte de “criancinhas” evocou 1989, o ano em que Collor trouxe para o centro da arena eleitoral Lurian.
Logo se descobriria que Collor escondia, ele próprio, um segredo. Patrocinou a acusação de que Lula propusera o aborto a uma antiga namorada...
...E recusava-se a reconhecer filho gerado fora do casamento. Collor negava-lhe o sobrenome da família.
Pois bem. Surge agora a informação de que a psicóloga Monica Serra também teria ceifado a vida de uma “criancinha”.
Em notícia levada às páginas da Folha, a repórter Mônica Bergamo conta o seguinte:
1. A mulher de Serra ministrava, em 1992, um curso de dança na Unicamp. Ex-alunas de Mônica dizem ter ouvido dela a revelação de que fez um aborto.
2. Quando? Na época em que vivia com Serra no Chile. No dia seguinte ao debate de Dilma com Serra, uma das ex-alunas de Mônica foi ao Facebook.
3. Chama-se Sheila Canevacci Ribeiro. É bailarina. Tem 37 anos. Ficou abespinhada com o silêncio de Serra. Levou sua “indignação” ao sítio de relacionamento.
4. Escreveu que Serra, por “escorregadio”, desrespeitou "tantas mulheres, começando pela sua própria mulher. Sim, Monica Serra já fez um aborto".
5. Prosseguiu: "Com todo respeito que devo a essa minha professora, gostaria de revelar publicamente que muitas de nossas aulas foram regadas a discussões sobre o seu aborto traumático".
6. Perguntou: "Devemos prender Monica Serra caso seu marido fosse [sic] eleito presidente?" A mensagem correu a web. A repórter da Folha foi ouvir Sheila. E ela confirmou “cem por cento” o teor de seu texto.
7. No primeiro turno, Sheila votou em Plínio de Arruda Sampaio. No segundo, votaria em Dilma. Mas estará no Líbano, onde fará uma performance.
8. Sheila é filha da socióloga Majô Ribeiro, ex-aluna de mestrado, na USP, de Eva Blay, suplente de Fernando Henrique Cardoso no Senado em 1993.
9. Militante feminista, Majô foi pesquisadora do Núcleo de Estudos da Mulher e Relações Sociais de Gênero da USP, fundado por Ruth Cardoso (1930-2008).
10. Ouvida, Majô se disse "preocupada" com a revelação da filha. Mas disse tê-la criado para "ser uma mulher livre". Acha que Sheila "agiu como cidadã".
11. A reportagem traz também declarações de uma colega de classe de Sheila nas aulas de dança da ex-professora Monica Serra.
12. Sob o compromisso do anonimato, a colega contou: Nas aulas da mulher de Serra, as alunas costumavam sentar-se em círculos.
13. Sob atmosfera de intimidade, Monica explicava como os traumas da vida alteram os movimentos do corpo e se refletem na vida cotidiana.
14. Era nesses momentos, segundo ela, que profressora e alunas compartilhavam suas experiências de vida. Nessas aulas, Monica teria falado sobre o aborto.
15. Segundo a ex-aluna, Monica disse que fez o aborto por causa da ditadura. Por quê? O futuro dela e do marido Serra era muito incerto. Grávida, sentiu-se em situação vulnerável.
16. Ouça-se agora mais um pouco de Sheila: "Ela não confessou. Ela contou. Não sou uma pessoa denunciando coisas. Mas [ela é] uma pessoa pública, que fala em público que é contra o aborto, é errado. Ela tem uma responsabilidade ética".
Retorne-se à pergunta inicial: Deve o eleitor considerar a opção religiosa e as vicissitudes íntimas de alguém no momento da escolha de um presidente da República?
Em condições normais, a resposta seria um sonoro “não”. Busca-se um presidente, não um santo. Porém...
Porém, ao servirem-se do discurso carola para desqualificar Dilma, Serra e Monica tornaram-se devedores de uma boa e consistente explicação.
Procurada por dois dias, a mulher de Serra não respondeu à reportagem. A assessoria de Monica alegou que ela viajara para o Chile e estaria ilocalizável. “Não há como responder”, informou-se, por e-mail. Pena.
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