quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Regulação da Comunicação Social no Brasil




‘Regulação dos meios eletrônicos não colocará em xeque a liberdade de imprensa’, diz o ministro Franklin Martins

Ministro Franklin Martins, da Sec. de Comunicação Social.
BRASÍLIA-DF – No seu discurso durante a abertura do Seminário Internacional das Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias, ontem, em Brasília-DF, o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, afirmou que a regulação dos meios eletrônicos não colocará em xeque a liberdade de imprensa.
O seminário, que teve início nessa terça-feira (9/11), encerra-se hoje quarta-feira (10/11), com a participação de diretores e especialistas de comunicação, entre eles Harald Trettenbein, Diretor Adjunto de Políticas de Audiovisual e Mídia da Comissão Europeia e o Diretor da Divisão de Desenvolvimento da Comunicação da Unesco, Wijayananda Jayaweera
Nos propósitos do Seminário, promovido pelo governo federal, está a discussão sobre a possibilidade de se criar uma agência reguladora para o setor de Comunicação Social no Brasil, o que tem sido motivo de críticas de quem considera que a iniciativa será uma forma de controle da informação.
Martins rebateu as ilações, enfatizando que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva "já deu provas de seu compromisso com a liberdade de imprensa", mesmo apanhando dela, muitas vezes, "por preconceito", muitas vezes, "por posições políticas".
-Essa história de que a liberdade de imprensa está ameaçada é uma bobagem. Ela hoje é mais ampla. Liberdade de imprensa não quer dizer que a imprensa não pode ser criticada, observada. Quer dizer que a imprensa é livre, não necessariamente, boa. Ela não está arranhada, quando se faz crítica a algum órgão - provoca, destacando ainda que o debate sobre o marco regulatório "custou a chegar".

CRÍTICA À CONCESSÃO POLÍTICA DE EMISSORAS DE RÁDIO E TV PARA DEPUTADOS E SENADORES

Durante o seminário, ontem (9/11), o ministro Franklin Martins criticou também a distribuição de emissoras de rádios e TVs para políticos. A declaração do ministro foi feita na abertura do Seminário Internacional das Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias.
Para Franklin Martins, “criou-se na área de comunicação a situação que é terra de ninguém. Deputados e senadores não podem ter, mas todos sabemos que eles têm TVs, obtidas através de subterfúgios variados. Está certo? Não! Está errado” — disse o ministro do governo Lula. Segundo o ministro, a discussão sobre concessão de meios de comunicação a parlamentares sempre foi contida e evitada. Nesse sentido, Martins diz que “agora é a oportunidade para se rediscutir tudo isso”, afirmou o ministro.
Franklin Martins disse ainda que o governo federal tem consciência de que é preciso dar um tratamento especial e prioritário à radiodifusão, porque ela tem sinal aberto, gratuito e chega a todo o país, beneficiando a população de menor poder aquisitivo.
O ministro voltou a defender um equilíbrio nesse mercado e reafirmou que as empresas de telecomunicação, como as telefônicas, faturam treze vezes mais que os meios de comunicação social. Para isso, Franklin argumentou: “isso não é bom para as classes C, D e E, que não têm acesso à comunicação eletrônica. Ninguém é tão forte para interditar esse debate, nem o governo, nem as teles, nem a academia”.
Assim, ao concluir o seu discurso, Franklin também voltou a dizer que regular o setor de comunicação e criar agência reguladora não significa estabelecer censura a jornais, rádios e TVs, momento em que disse: “o fantasma mais renitente e mais garboso dessa discussão é a tese de que regulação é sinônimo de censura à imprensa”. Franklin Martins complementa ainda: “Regulamentação da mídia é algo comum em qualquer país democrático"
A Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) recomendou ao Brasil que retire do Congresso a prerrogativa de aprovar concessões de rádio e TV e crie um órgão independente para regular o conteúdo da mídia eletrônica. A organização internacional sugeriu a criação de cotas obrigatórias para programação regional e produção independente nas emissoras de TV. Propôs ainda que as emissoras façam autorregulação, para adaptar suas condutas à regulação oficial e assim evitar a intervenção do órgão regulador governamental.
A Unesco estudou a radiodifusão no Brasil durante oito meses e apresentou seu diagnóstico no seminário internacional realizado pelo governo. O evento termina hoje.

Por que a mídia teme o debate?

Ricardo Kotscho*

“A proposta é recebida com receio pelo setor, que teme o cerceamento do conteúdo jornalístico”, escreveram na Folha as repórteres Elvira Lobato e Andreza Matais, sobre o seminário promovido pelo governo federal, que começa nesta terça-feira, em Brasília, com o objetivo de discutir uma nova regulamentação para os meios de comunicação eletrônica. Os outros jornais também mostraram o mesmo receio.
Afinal, o que tanto temem os barões da mídia? É sempre a mesma coisa: basta qualquer setor da sociedade civil ou representantes dos três poderes colocarem em discussão a regulamentação dos meios de comunicação social no país para que as entidades representativas do setor reajam em bando, assustadas, como se um exército de censores estivesse de prontidão para acabar com a liberdade de imprensa no país.
Do que se trata? Com base na legislação de outros países, que enviaram representantes ao seminário, o atual governo está preparando um anteprojeto de lei para estabelecer novas regras do jogo numa área revolucionada nos últimos anos pelos novos meios eletrônicos.  O resultado deste trabalho será entregue à presidente eleita Dilma Rousseff, que decidirá se enviará ou não um projeto de lei ao Congresso Nacional, a quem cabe a última palavra.
Em qualquer democracia do mundo, é assim que as coisas funcionam. Aqui, não. Nossa mídia não admite que nenhuma instância da sociedade, dos parlamentos ou dos governos eleitos se atreva a se meter em sua seara. É como se a mídia constituisse um mundo à parte, uma instituição autônoma, acima do bem e do mal, inimputável como as crianças e os índios.
Desde o começo do primeiro governo do presidente Lula, já se gastaram milhares de quilômetros de matérias em jornais e revistas e horas sem fim de comentários em emissoras de rádio e televisão para falar das ameaças à liberdade de expressão no Brasil. O nome do fantasma é “controle social da mídia”, um negócio que ninguém sabe direito o que é nem como faz para funcionar, mas é muito perigoso.
Pergunto: qual foi até agora a iniciativa concreta do governo Lula para cercear qualquer profissional ou orgão de imprensa? Sim, eu sei, falarão do episódio da “expulsão” do correspondente Larry Rother, um grave erro do governo que não se consumou, e da “censura” ao Estadão, que já dura não sei quantos séculos, impedido de falar dos rolos de um filho do ex-presidente José Sarney, por determinação da Justiça.
Só por ignorância ou má fé casos assim podem ser citados por entidades como a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), venerando clube que congrega o que há de mais reacionário e ultrapassado no continente, como exemplo de que no Brasil não vigora a mais absoluta liberdade de imprensa e de expressão.
Não adianta o ministro Franklin Martins, da Comunicação Social, responsável pelo seminário e pelo anteprojeto, repetir mil vezes que o objetivo da discussão é defender, e não ameaçar, a radiodifusão, que sofre a pesada concorrência das empresas de telecomunicação. “Se prevalecer só o mercado, a radiodifusão será atropelada da jamanta das teles”.
Os números publicados pela Folha dão razão a Martins. “Enquanto as teles faturaram R$ 144  bilhões em 2009, o faturamento somado das rádios e TVs foi de R$ 13 bilhões e R$ 15 bilhões”, informa o jornal. O ministro também descarta qualquer “controle social” sobre a mídia. “A imprensa já é observada, criticada e fiscalizada pela internet, que, aliás, faz isso de forma selvagem, mas faz”.
A maior prova de que as empresas e suas entidades representativas não querem regulamentação alguma e só aceitam prestar contas a Deus, se acharem necessário, foi o fracasso da tentativa de criar uma comissão, no último encontro da Associação Nacional de Jornais (ANJ), para começar a discutir a autorregulamentação do setor.
Na área de publicidade, a iniciativa foi tomada há mais de 30 anos com o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que envolve agências, veículos e anunciantes, e funciona muito bem. Mas as Organizações Globo foram contrárias à criação da comissão e, portanto, não se falou mais no assunto.
É esta, por sinal, a principal recomendação do estudo “Indicadores da Qualidade de Informação Jornalística”, que será lançado hoje pela Unesco, com base em 275 questionários respondidos por profissionais de todo o país. “Cabe às empresas do setor definir os padrões de qualidade”, resumiu Guilherme Canela,  o coodenador do estudo, que propõe a autorregulação.
Só falta agora os tementes da SIP, da Abert, da ANJ (da líder oposicionista Judith Brito), da Aner, os de sempre, enfim, acusarem a Unesco, um orgão da ONU, de se meter onde não foi chamada e ameaçar a liberdade de imprensa no Brasil.   
Razão tem meu amigo Luciano Martins Costa, que escreveu ontem no “Observatório da Imprensa” a melhor definição sobre a crise existencial vivida pela nossa velha imprensa:
“O que acontece é que as empresas tradicionais de mídia vivem no regime monárquico e lutam para impedir a proclamação da República”.
 *Ricardo Kotscho, 62, é repórter. Jornalista desde 1964, já trabalhou em praticamente todos os principais veículos da imprensa brasileira (jornais, revistas e redes de TV), nas funções de repórter, editor, chefe de reportagem e diretor de redação. Foi correspondente na Europa nos anos 1970 e exerceu o cargo de Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República no governo Luiz Inácio Lula da Silva, no período 2003-2004.
Editar coluna jornalística no seu Blog “Balaio do Kotscho”. Clique aqui no “Balaio” 

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