Silvana Diamantino França[a], José França Neto[b], Maria Isabel Barros Morais Costa[c] e Ana Paula da Mota França[d]
[a] Professora Mestre da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes e pesquisadora do projeto de pesquisa Inclusão Escolar na Universidade/ Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – Fapemig – sildiamantino@gmail.com, silvana.diamantino@unimontes.br; [b] Professor Mestre da Unimontes e pesquisador do projeto de pesquisa Inclusão Escolar na Universidade/Fapemig – francaneto@gmail.com, jose.franca@unimontes.br, francaneto@ufmg.br; [c] Professora Doutora da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD/Portugal) – isacosta@utad.pt; [d] Graduanda em Letras, com habilitação em Língua Portuguesa, pela Unimontes, e bolsista do projeto de pesquisa Inclusão Escolar na Universidade/Fapemig – anapaula_mota_franca@hotmail.com.
Professores-pesquisadores da Unimontes debatem em Congresso sobre a Educação Inclusiva, no Centro de Convenções em Salvador-BA - nov./2011. |
1. Introdução
O fenômeno da inclusão escolar tem produzido debate crítico acerca da construção do conhecimento nas universidades brasileiras, por meio da discussão sobre a relação pedagógica entre os saberes e as práticas de alunos especiais e professores nesses espaços acadêmicos.
Dessa maneira, ao depreender sobre esse fenômeno, este estudo tem como objetivo analisar as formas de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais e as percepções dos docentes nos cursos de licenciaturas da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes.
Tendo em vista que a universidade tem um papel social relevante na relação que se estabelece entre os diversos atores na sociedade, uma indagação central perpassa pelo nosso objeto de estudo, ou seja, qual o espaço de legitimação da inclusão escolar-especial na Unimontes para o acesso à educação superior de qualidade e cidadania, através de seu conjunto de saberes e práticas de caráter científico e histórico-cultural acumulado?
Nesse sentido, acredita-se que a universidade desempenha um papel importante na formação de cidadãos críticos, éticos, conscientes de seus direitos e deveres na sociedade. Além do mais, conjectura-se que essa importância da Unimontes tende a se representar, de forma inclusiva, no seu contexto de atuação, com a legitimação de seu espaço acadêmico-científico para o conhecimento e para a cidadania, onde se tem despertado a consciência de que indivíduos com necessidades especiais não podem ser alijados do seu direito de usufruir as vantagens de suas ofertas nas dimensões do ensino, da pesquisa e da extensão acadêmica.
Na metodologia, desenvolvemos uma pesquisa exploratória documental em matrículas nos cursos de licenciatura da Unimontes, por meio da coleta de dados no Sistema de Cotas da secretaria geral; e de informações sobre os alunos NEEs matriculados nos cursos de licenciatura da universidade, levantadas pelo Núcleo da Sociedade Inclusiva (NUSI) da Unimontes. Sendo assim, propomos uma pesquisa de enfoque quanti-qualitativo, através de questionário aplicado a nove (9) alunos especiais nos cursos de licenciatura da Unimontes e de uma entrevista com três (3) professores que atuam nesses cursos.
Para essa discussão, recorremos, na revisão de literatura, a autores diversos, como Barbosa (2008), Freitas (2005), Zimmermann (2008), dentre outros, que debatem sobre os aspectos da inclusão escolar, produzindo, assim, uma teoria discursiva à volta do nosso objeto de estudo.
Assim, esta pesquisa desvela-se como um estudo relevante para o conhecimento acadêmico, na medida em que se tenta problematizar e analisar o fenômeno da inclusão escolar na universidade.
2. Trajetória, Concepções e Marco Legal sobre a Inclusão Educação Especial
A trajetória da inclusão de pessoas com necessidades especiais, tanto na escola quanto na sociedade, nem sempre foi aceita no decorrer da história da humanidade. Segundo Freitas (2005), observa-se que, durante a Idade Antiga, a pessoa portadora de necessidades especiais física, por exemplo, era pouco considerada para exercer atividades na sociedade. Atribuía-se a esse indivíduo dizendo que ‘sua deficiência era resultado de forças sobrenaturais’. Além disso, propalava-se, na Idade Média, que ‘sua deficiência era resultado da união entre a mulher e o demônio’.
No século passado (séc. XX), os alunos com necessidades especiais, na escola, eram considerados ‘um problema para o funcionamento das escolas e a presença deles prejudicava a aprendizagem dos demais colegas, em sala de aula’.
Ainda no século XX, nas décadas de 1960 e 1970, inicia-se, portanto, ‘um novo olhar’ sobre esses indivíduos na escola, tratando-os como alunos portadores de necessidades especiais e enxergando suas dificuldades e potencialidades no processo de aprendizagem, através de movimentos de integração e inclusão desses sujeitos na educação (FREITAS, 2005).
Dessa forma, o movimento de inclusão escolar veio a se consolidar no Brasil após a Declaração de Salamanca, que teve como alvo a inclusão escolar de crianças portadoras de necessidades especiais em 1990. Essa foi uma grande incentivadora para construção da Política Nacional para Inclusão das Crianças com Necessidades Especiais e elaboração das leis da educação especial.
A Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, em Brasília-DF, instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial no País, através da Resolução CNE/CEB Nº 2, de 11 de Setembro de 2001, que a estabeleceu como uma modalidade escolar da Educação Básica, sendo, portanto, entendida como:
Um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica. (CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO - Resolução CNE/CEB nº 2/2001).
Assim, a escola passou então a lidar em sua organização e seus espaços, sob o viés da “inclusão, (...) cujo objetivo principal era fazer com que a escola se tornasse inclusiva, através de um espaço democrático (...) para trabalhar todos (...), sem distinção de raça, classe, gênero ou características pessoais” (BRASIL, 2001, p. 40) [1].
Mas, diante de tais definições, qual seria acepção do papel da Universidade inerente aos alunos dos cursos de licenciatura que apresentam necessidades educacionais especiais? Com a Constituição Federal de 1988, que estabeleceu ‘o direito das pessoas com necessidades especiais receberem o atendimento preferencialmente na rede regular de ensino’, bem como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que, segundo Brasil (2011), define a educação especial como uma ‘modalidade da educação escolar’, devendo, portanto, assegurar “um conjunto de recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todos os níveis etapas e modalidades da educação” (BRASIL, 2004) [1].
Nesse aspecto, entende-se que, de acordo com essas Diretrizes, os alunos com necessidades especiais (ou necessidades educacionais especiais)[1] devem ser assegurados, na escola, em quaisquer situações e condições, como: (1) ‘com problemas mentais’; (2) ‘com deficiências múltiplas’; (3) ‘com problemas de audição’; (4) ‘com problemas de visão’; (5) ‘com problemas físicos; (6) ‘com problemas de conduta’ e (7) ‘com altas habilidades/superdotados (BRASIL, 2004, p. 202-210) [1].
Ao verificar que, no Brasil, há leis, decretos e resoluções que garantem a inclusão escolar para os indivíduos portadores de necessidades especiais, todavia, esses princípios refletem apenas como orientações de um marco legal que não dialogam ainda, de forma coerente, com a realidade dessas pessoas, que, na maioria das vezes, se caracteriza por atributos complexos e contextos diferenciados.
Sendo assim, para se ter um sistema educacional inclusivo, de acordo com Zimmermann (2008), torna-se necessário algumas ações, como: (1) redefinir a base e estrutura organizacional (reviravolta complexa, mas possível) da instituição; (2) família – escola como rede de apoio; (3) romper paradigmas; (4) partir do principio de que todas as crianças podem aprender; (5) estabelecer um sistema metodológico que atenda às necessidades especiais na escola; (6) realizar uma prévia reforma de instituição – reforma de mente – reforma da instituição escolar; (7) formular políticas públicas de educação direcionadas à inclusão; (8) motivar educadores (desacomodados) (educação baseada na afetividade e superação de limites); (9) participar, através de posicionamento social.
3. Debate sobre as políticas públicas de inclusão na sociedade
Ao debater o modo de inclusão universal, observa-se aqui uma convergência de aspectos dessas políticas para um modelo de política do “Estado de Bem-Estar Social”, também conhecida Welfare State (Estado da Providência), desenvolvido por países capitalistas, nos anos de 1945 a 1970, na Europa Ocidental. As políticas de Welfare State constituem basicamente pela incorporação dos direitos sociais ao cidadão, visando, sobretudo, ‘garantir a todos os indivíduos um padrão mínimo de bem estar econômico e social’. Esses direitos sociais foram entendidos nas políticas públicas do Welfare State como sendo os seguintes: a) direito à educação; b) direito ao trabalho; c) direito à tutela da saúde; e, d) direito à assistência social (DEZEN JUNIOR et al, 2003).
No entanto, com a crise do Estado assinalada, na década de 1980, por meio da perspectiva econômica neoliberal de ruptura do sistema estatal, um outro eixo foi fundamentado no campo das políticas públicas: a focalização. Para Draibe (1994) apud Silva (2002, p. 143-144), a focalização é entendida como “direcionamento seletivo dos gastos sociais, considerando a necessidade e a urgência evidenciada pelas demandas sociais”.
Desse modo, ao lidar com uma política pública da educação especial, formula-se geralmente pelo envolvimento de ações articuladas entre as políticas de governo e órgãos e os seus serviços e atividades ofertadas pelas instituições aos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais. Segundo Carvalho (2002), esse caráter universal passa pela compreensão de “educação para todos”, a qual foi formulada pelos organismos internacionais (OI) e pelas Nações Unidas (ONU) na declaração de Salamanca, na Espanha, em 1994, que ratificou o compromisso pela educação inclusiva, por meio do desenvolvimento da educação especial no ensino regular.
4. O Contingente de Alunos com Necessidades Especiais no Brasil
Em 1998, de acordo com levantamento de dados do MEC, havia registrado 293.403 alunos em condições especiais, no Brasil, sendo que 58% deles ‘com problemas mentais’; 13,8% ‘com deficiências múltiplas’; 12% ‘com problemas de audição’ e 16,2% restantes (com problemas ‘de visão’, ‘físicos’ e ‘de condutas atípicas’ e ‘superdotados’).
A inclusão de pessoas com necessidades especiais em cursos presenciais de graduação aumentou 425% nos últimos nove anos no País. De acordo com dados do último Censo da Educação Superior, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC), no mês novembro de 2009, o Brasil alcançou, em 2008, o número de 11.412 portadores de necessidades especiais matriculados em universidades e faculdades.
Entretanto, esses alunos com necessidades especiais, nas instituições de ensino superior, representam somente 0,22% dos mais de 5 milhões de universitários. Existem, portanto, no Brasil mais de 24,6 milhões de portadores de necessidades especiais, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Diante disso, nota-se que, segundo Barbosa (2008), cresce, através de levantamento anual do Censo Escolar, o número de alunos com necessidades especiais matriculados em escolas regulares, mas o acesso dessas pessoas ao ensino superior é pequeno. Além do mais, outra dificuldade ainda maior é permanência e o sucesso desses alunos no ensino superior, pois a cada avanço na estrutura há menos ajuda e assistência especializada, o que acarreta em desistências (BARBOSA, 2008).
5. Análise e interpretação da inclusão escolar-especial na Universidade
Ao analisar alguns dados preliminarmente, observa-se que, de acordo com as informações levantadas na Secretaria Geral e no Nusi/Unimontes, a Universidade tem, hoje, 18 alunos com necessidades especiais matriculados em oito graduações no sistema presencial de ensino da instituição, correspondendo, portanto, 0,16% no contingente de mais 11 mil alunos matriculados, em janeiro de 2011, dos 27 cursos ofertados pela Unimontes (bacharelado e licenciatura).
Gráfico 1 – Distribuição [%] de Alunos com Necessidades Especiais na Unimontes, M. Claros (MG) março 2011
Fonte: Pesquisa sobre a Inclusão Escolar na Universidade/Unimontes - FAPEMIG
Entendendo um pouco mais esse universo da inclusão escolar-especial na Unimontes, verifica-se que 66,7% dos alunos com necessidades especiais educacionais (NEEs) concentram-se seus estudos no Centro de Ciências Humanas – CCH; 22,2% deles no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde; 11,1% no Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Além disso, 44,8% deles cursam Ciências Biológicas (22,4%) e licenciatura plena em Pedagogia (22,4%); 27,5% deles estão distribuídos nos cursos de Artes – Visuais, Artes – Música, Filosofia, Letras – Espanhol e Direito, com cada curso tendo 5,5% de alunos matriculados; 16,7% fazem História; e, 11% deles estão matriculados em Educação Física (ver Gráfico 1).
5.1.1 Percepções de alunos com NEEs sobre a inclusão escolar na Unimontes
Desse universo de 18 alunos com necessidades especiais educacionais (NEEs), constituídos entre licenciatura e bacharelado na Unimontes, delimitamos em nosso estudo em investigar apenas os acadêmicos com NEEs que estão cursando licenciatura plena na universidade, cumprindo, assim, com a meta central estabelecida no nosso objetivo de pesquisa. Em outras palavras, o nosso universo de pesquisa analisou apenas nove (9) estudantes com NEEs, que possuíam licenciatura plena em áreas do conhecimento em ‘humanas’ e ‘biológicas/da saúde’, como: Pedagogia, Letras Espanhol, História, Artes Música e Visuais, Filosofia, Educação Física – licenciatura e Ciências Biológicas – licenciatura.
Ao traçar o perfil socioeconômico desses nove alunos com NEEs na Unimontes, 77,8% deles ganham uma renda familiar mensal entre ‘menos de um salário mínimo’ e ‘de um a três salários mínimos’; 22,2% deles estão entre as faixas de renda ‘de quatro a seis salários mínimos’ e ‘acima de dez salários mínimos’.
Além do mais, a situação economicamente ativa desses acadêmicos se expressa da seguinte forma: 22,2% são funcionários públicos; 22,2% são aposentados e 22,2% deles possuem vínculo empregatício em empresas em Montes Claros; 11,2% dos alunos são autônomos, trabalhando com algum negócio próprio; 11,1% deles têm a ocupação como estudante e 11,1% não responderam esse quesito no questionário.
Ainda, nota-se que a grande maioria deles é originária de escola pública, ou seja, 66,7% desses acadêmicos cursaram o ensino médio tanto na rede estadual quanto na rede municipal de ensino, em Montes Claros. O restante desses alunos é oriundo da rede privada de ensino, em sua conclusão no ensino médio.
Em relação às modalidades especiais desses alunos na Unimontes, classificam-se variando entre os seguintes tipos: 66,7% deles possuem necessidades especiais ‘física’; 22,2% ‘visual’ e 11,1% ‘auditiva’.
Ao correlacionar essa realidade dos números na Universidade com o contingente de alunos com necessidades especiais no País, observa-se que, ao representarem somente 0,16% no contingente de mais 11 mil alunos na Unimontes, esses números são considerados ínfimos, ficando, portanto, abaixo de 0,22%, que é o percentual nacional desses estudantes universitários matriculados nas instituições de ensino superior no Brasil, conforme levantamento do IBGE citado anteriormente.
Em relação ao tipo de transporte utilizado pelos alunos para se chegar até Universidade [Unimontes], 55,6% deles utilizam o ‘transporte de coletivo de ônibus sem adaptações para o usuário com necessidades especiais’; 22,2% utilizam veículo automotivo, comum de passeio, sem adaptações para o passageiro com necessidades especiais; 11,1% utilizam o ‘transporte de coletivo de ônibus com adaptações para o usuário com necessidades especiais’; e, 11,1% utilizam a bicicleta ou motocicleta sem adaptações para o passageiro com necessidades especiais, como meio de transporte para se chegar até o Campus Universitário Professor Darcy Ribeiro/Unimontes.
Com relação ao Sistema de Cotas/Unimontes, visto como um ‘fator de inclusão no ensino superior’ pelos alunos com NEEs, 55,6% deles acreditam que o Sistema “inclui integralmente” esses indivíduos nos diferentes espaços acadêmico-científicos da universidade; 33,3% percebem que o Sistema ‘inclui parcialmente’ na instituição; e 11,1% disseram que “ainda não possui uma opinião” sobre essa questão.
Ao indagar sobre ‘o preconceito sofrido’ ou ‘alguma forma de discriminação’ na Unimontes, 55,6% disseram ‘não sofrer nenhum preconceito’ nos espaços freqüentados na universidade. No entanto, uma parcela significativa [44,4% dos alunos com NEEs da Unimontes] considera que eles são “sim discriminados” nos diferentes ambientes da instituição.
Para esses alunos que se sentem discriminados na instituição, eles alegaram as seguintes razões em suas justificativas: “rejeição por parte de todos” na universidade; “na apresentação de trabalhos”, em grupo, na sala de aula, eles se sentem alijados do processo de ensino-aprendizagem; na parte arquitetônica e física das edificações da universidade, os alunos com NEEs sentem-se discriminados por causa da “distância entre salas e laboratórios, além de escadas”, que foram verificadas, por parte dos estudantes, nos prédios da Unimontes. Além disso, os alunos alegam “discriminação”, quando “não é oferecido oportunidades aos deficientes [visual]” (sic), na divulgação de programas e projetos da Unimontes.
Quanto à atribuição das dificuldades feita pelos alunos com NEEs, 55,6% deles disseram ter ‘dificuldades’ no desenvolvimento do seu processo de ensino-aprendizagem na universidade. Em algumas de suas justificativas, os acadêmicos retrataram da seguinte forma: “os recursos didático-pedagógicos não oferecem a devida atenção aos portadores de deficiência” (sic); os aspectos físicos e de infra-estrutura na instituição, “as ideias de progresso” sobre inclusão especial que, segundo eles, “só ficam mais no papel”, com dificuldades de implantação e adaptação na instituição; dificuldade também observada pelos alunos em “participar de trabalhos de campo” na universidade. No entanto, 44,4% dos estudantes com NEEs argumentam que não vêem dificuldades no seu desenvolvimento acadêmico na Unimontes, justificando que a universidade possui elementos facilitadores tanto no aspecto físico quanto nos aspectos administrativo-curriculares de sua aprendizagem, desde matrícula semestral até a inovação na proposta curricular do curso que realizam.
Embora a maioria deles tenha apontado elementos dificuldades no seu desenvolvimento, 55,6% revelam que a metodologia de ensino utilizado pelo seu professor “é facilitadora para a aprendizagem de alunos” com NEEs na universidade. 22,2% disseram, quanto a esse quesito, que “é dificultadora na sua formação acadêmica, pois, de acordo com alunos, ‘faltam recursos didático-pedagógicos’ voltados para o aluno NEEs. O restante dos alunos (22,2%) não respondeu a esse quesito.
Apesar da maioria deles considerar a metodologia do professor adequada, 55,5% acreditam que o material didático usado em sala de aula é o elemento dificultador na sua aprendizagem, pois, segundo eles, ‘incorpora, de forma regular’, aspectos de sua realidade, ou seja, da realidade dos indivíduos com NEEs. Entretanto, 44,5% acreditam que o material didático apresenta elementos facilitadores na aprendizagem.
Ainda, em relação à situação da infraestrutura da Unimontes para alunos NEEs, 77,8% consideram as condições físico-arquitetônicas dos prédios da universidade entre ‘regular’ (66,7%) e ‘ruim’ (11,1%). Os demais (22,2%) atribuem a situação das instalações físicas e de infraestrutura entre ‘ótima’ e ‘muito boa’.
Além do mais, 77,8% desses alunos desconhecem acerca das políticas e dos princípios da universidade para o aluno com NEEs, pois não há uma divulgação clara e efetiva em manuais, cartilhas, cartaz e diferentes espaços de comunicação na instituição. 22,8% afirmaram, sem justificativas, que conhecem essas políticas e princípios da instituição para os indivíduos especiais.
Em face das dificuldades levantadas pelos acadêmicos, quanto aos ‘recursos e materiais didático-pedagógicos’ e às condições físico-arquitetônicas dos prédios da instituição, eles propõem, em suas justificativas, três sugestões básicas para fazer adequação às políticas da universidade para os indivíduos com NEEs, tais como: (1) “capacitação para professores” da universidade para saber ‘utilizar o material didático adequado à realidade dos alunos com NEEs’, realizando, assim, uma ação docente correta para ‘lidar com diferentes situações em sala de aula’; (2) ampliação de “elevadores e rampas para cadeirantes” em todos os prédios da universidade”, inclusive com “rampas para o embarque e desembarque de passageiros com NEEs em ônibus coletivos e demais veículos automotores” que circulam no campus universitário; (3) ‘maior divulgação das políticas e princípios’ para os alunos com NEEs, além da ‘comunicação de programas e projetos de pesquisas’ para esses alunos na universidade.
5.1.2 Percepções de professores sobre a inclusão escolar na Universidade
Após entender essa realidade dos alunos com NEEs, desenvolvemos então uma entrevista, através de perguntas semi-estruturadas, com três (3) professores[1] da Unimontes que atuam nos cursos de licenciatura do Centro de Ciências Humanas. Assim, inquirimos três docentes da universidade questões versando sobre ‘acessibilidade’ e ‘permanência de alunos com NEEs’; ‘adaptações curriculares e métodos de ensino utilizados nas práticas educativas para alunos com NEEs’; ‘material didático e projetos utilizados no processo de aprendizagem de estudantes com NEEs’; e, concepções e abordagens da formação inicial ou continuada do professor para lidar no ensino-aprendizagem de alunos com NEEs’, dentre outras indagações acerca desse assunto.
Nesse aspecto, entrevistamos esses professores no sentido de que eles pudessem esclarecer sobre suas principais concepções e práticas pedagógicas com alunos com NEEs na universidade.
Assim, o perfil da formação acadêmica desses professores é o seguinte: todos eles possuem licenciatura plena em Letras, com pós-graduação stricto sensu.
Ao indagar acerca da inclusão de alunos com NEEs na universidade, solicitamos a opinião desses professores sobre a acessibilidade e permanência nos espaços acadêmico-científicos da universidade.
Dessa forma, sobre acessibilidade e permanência de alunos com NEEs, os professores declararam as seguintes opiniões:
Pf1: Entendo que é dar a essas pessoas a oportunidade de ocupar um espaço que é delas de direito. [...] Como prevê a Lei, a Constituição, que, muitas vezes, não é cumprida, né, mas eu acredito que já com a política educacional já está tendo algumas mudanças que, aos poucos, vai aparecer, é claro! Só que não também não vai ser tão fácil assim não, porque muitas pessoas têm resistência. A bem da verdade, as pessoas têm preconceito, então acaba que não dá para ser 100%, para ter um resultado imediato de todo processo, porque a gente tem essas questões que é do próprio...que o próprio ser humano cria, né;Pf2: É permitir a entrada desses alunos através dos mais variados recursos, possibilitando aos alunos o acesso à avaliação e seleção na universidade. Além disso, possibilitando o bem-estar desse aluno nos seus espaços para garantir a permanência.Pf3: É propiciar o ingresso desses sujeitos na Universidade, fazendo adaptações no seu sistema de ensino e conteúdos para garantir o acesso e a permanência deles na instituição. Ou seja, por acessibilidade, eu entendo que são adequações realizadas para o ingresso desses indivíduos na universidade que possibilitam, desde do sistema de cotas, inovações curriculares, até as adaptações na infra-estrutura física (informes de relatos verbais)[2].
Nas adaptações curriculares das práticas educativas para os alunos com NEEs, os três professores disseram que, no curso de Letras (Português, Espanhol e Inglês), “nós já temos Libras no nosso currículo”, trazendo assim “algo no currículo novo” desses cursos. O curso Letras ministra a disciplina Língua Brasileira de Sinais (Libras) ‘não só para o curso, como, também, para outros cursos’ na universidade. E, ainda, dos 98 professores do curso, quatro deles possuem especialização, mestrado e doutorado nessa área para educação especial, inclusive em Libras.
Ainda, sobre ‘as concepções e abordagens da formação inicial e continuada’ dos docentes ‘para lidar com o processo de ensino-aprendizagem de alunos com NEEs’, os professores responderam da seguinte maneira:
Pf1: Eu trabalho com linguagem, seja ela verbal, seja ela não-verbal. Então, nas vezes em que trabalho com a linguagem, eu também passeio pelas duas condições que estão mais próximas da gente, que é o Braile e a Libras, a linguagem mais próxima, mais acessível;Pf2: Não tive nenhum um preparo tanto na formação inicial quanto na continuada para trabalhar com esses alunos em sala de aula. Ou seja, não tive uma formação específica para trabalhar estudantes com necessidades especiais na universidade;Pf3: Na minha formação inicial, eu não tive nenhum enfoque ou conteúdo sobre a NEEs. No entanto, fiz cursos de Libras, dentre outros com o enfoque nas NEEs, durante minha formação continuada. Acredito que, hoje, estou preparada para trabalhar com esse aluno em sala de aula (informes de relatos verbais)[3].
Pelo fato dos três professores não possuírem uma experiência em sala de aula com alunos com NEEs na universidade, eles restringiram em responder sobre outras perguntas, como o tipo de “material didático” utilizado no trabalho docente para facilitar o processo de ensino-aprendizagem desses estudantes. Mas, eles acreditam que a universidade deve adotar materiais, cartilhas e literatura, em sistema de escrita em relevo para cegos [o braile] e códigos de sinais em Libras.
6. Considerações
Ao analisar o fenômeno da inclusão de alunos com necessidades especiais e a percepções de professores nos cursos de licenciatura Unimontes, entende-se que a realidade da educação especial na universidade, segundo Brasil (2004) [1], tende a apresentar um quadro com a situação muito mais complexa do que as outras modalidades verificadas nos níveis da educação básica, pois seus ‘dados e informações apresentam precários’ diante de um contingente incerto desses universitários e sua real condição especial.
Diante disso, considera-se, também, que as percepções, tanto de alunos quanto professores, sobre a inclusão de estudantes com NEEs na Unimontes, vão ao encontro do argumento acerca das diretrizes normativas da educação especial no País, o qual, segundo Brasil (2004) [1], diz que a falta de uma “política de apoio pedagógico para essas necessidades especiais” pode fazer com que esses alunos não estejam na universidade. A falta desse apoio pode, ainda, fazer com que esses estudantes “deixem a universidade depois de pouco tempo, ou permaneçam sem progredir para os níveis mais elevados de ensino”, o que é uma forma de desigualdade de condições de permanência (BRASIL, 2004) [2].
Dessa forma, considera-se, enfim, que o acesso, o ingresso e a permanência dessas pessoas com algum tipo de necessidade especial no ensino superior não devem ser pautadas somente pelo um caráter meramente assistencialista, fomentando, assim, uma focalização das políticas públicas educacionais para esses indivíduos com NEEs. Mas, devem adotar, sobretudo, medidas ou políticas, de caráter universal, que valorizem esses sujeitos na sua plenitude de seus direitos sociais, ou mesmo, no acesso aos bens educacionais, científicos e artístico-culturais na sociedade, ou melhor, na universidade.
7. Referências
BARBOSA, Ana M. E. Caetano. Inclusão escolar e a Universidade, 2008. Portal Pró-Menino. Disponível em: . Acessado em 31 jul. 2011.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica. Brasília: Secretaria de Educação Especial, 2001.
______. Direito à Educação: subsídios para a gestão dos sistemas educacionais: Orientações Gerais e Marcos Legais. Brasília: Secretaria de Educação Especial, 2004 [1].
______. Concepções, princípios e diretrizes de um sistema educacional inclusivo. Brasília: MEC – Palestra conferida no lançamento do Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, 2004 [2].
CARVALHO, Rosita Edler. A Nova LDB e a Educação Especial. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Câmara de Educação Básica. Resolução CNE/CEB Nº 2, de 11 de Setembro de 2001. Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Disponível em: . Acessado em 30 de junho de 2011.
DEZEN JUNIOR, Gabriel; GRANJEIRO, J. W.; SOCOLIK, H. e MAGALHÃES, J. A. F. de. Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Brasília: Editora VESTCON, 2003.
DRAIBE, Sônia M. As políticas sociais e o neoliberalismo: reflexões suscitadas pelas experiências latino-americanas. In: Revista USP, n° 17. São Paulo: EDUSP, P. 86-101, 1994, citado por SILVA, Marcelo Soares Pereira da Organização do trabalho escolar e políticas educacionais no limiar do século XXI. Uberlândia: EDUFU, 2002.
FREITAS, Raquel Zappia. Inclusão escolar de alunos com necessidades educacionais especiais: realidade ou utopia (2005). Memorial de Conclusão de Curso - Programa Especial de Formação para Professores em Exercício (Proesf) da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas. Disponível em: < http://libdigi.unicamp.br/document/?code=35929>. Acessado em 30 de julho de 2011.
SILVA, Marcelo Soares Pereira da. Organização do trabalho escolar e políticas educacionais no limiar do século XXI. Uberlândia: EDUFU, 2002.
ZIMMERMANN, Elizete Camargo. Inclusão Escolar, 2008. Disponível em: . Acessado em 31 de julho de 2011.
Sites Consultados:
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE (UFF). Cresce o número de matrículas de alunos com deficiência no ensino superior. Disponível em: . Acessado em 15 de julho de 2011. [1] Para FERREIRA (1999), Portador de necessidades especiais (Educação Especial): Indivíduo que apresenta, em caráter permanente ou temporário, algum tipo de deficiência física, sensorial, cognitiva, ou múltipla, ou condutas típicas (v. conduta típica), ou altas habilidades (q. v.), necessitando, por isso, de recursos especializados para desenvolver mais plenamente o seu potencial e/ou superar, ou minimizar, suas dificuldades. [No contexto escolar, costuma ser chamado portador de necessidades educacionais especiais. Confira em: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio - Século XXI. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999 [Versão eletrônica em CD-ROM].
[2] Informes de relatos de professores dos cursos de licenciatura sobre a inclusão escolar-especial no CCH/Unimontes. Entrevista realizada em junho de 2011.
[3] Informes verbais. Ibidem.
* Artigo Científico apresentado no III Congresso Baiano de Educação Inclusiva: Práticas, Formação e Lugares/I Simpósio Brasileiro de Educação Inclusiva, realizado de 30 de outubro a 1º de novembro de 2011, Centro de Convenções, Salvador - Bahia, com a participação e o debate crítico-acadêmico de docentes, estudantes de graduação e de pós-graduação, pesquisadores, e profissionais de diversas áreas do conhecimento no Brasil. Disponível em: http://www.3cbei.ufba.br/
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