Reforma do ICMS pode ser um dos desafios
do ‘pacto federativo’ nas votações do Senado no segundo semestre
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Senado Federal deve ser palco de grandes votações no 2º semestre deste ano, como a 'Reforma Fiscal'. Ana Volpe/Agência Senado. |
Com Agência Senado
BRASÍLIA - O Senado
terá de resolver, no segundo semestre de 2015, um dos maiores desafios do pacto
federativo, que é a reforma do Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O tema está na pauta da
Casa desde 2013, com avanços e recuos desde então. A maioria dos estados
brasileiros precisa da reforma para legalizar os incentivos da guerra fiscal, e
o governo federal também a defende com o objetivo de estimular a retomada da
economia. Mas há uma série de obstáculos e riscos pelo caminho.
O Projeto
de Resolução do Senado (PRS) 1/2013, com a redução das alíquotas interestaduais
do imposto, chegou a ser aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) em
7 de maio de 2013. Quando estava pronto para votação em Plenário, requerimentos
dos senadores Ricardo Ferraço (PMDB-ES), Inácio Arruda (PCdoB-CE) e Cássio
Cunha Lima (PSDB-PB) levaram o projeto para as Comissões de Desenvolvimento
Regional e Turismo (CDR) e de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Na CDR, o
relator, senador Wellington Fagundes (PR-MT), vem mantendo entendimentos para a
elaboração de um substitutivo ao projeto aprovado pela CAE. Um eventual acordo
sobre o assunto poderá ter como base o Convênio ICMS 70/2014, que só não
recebeu o apoio do estado do Paraná no Conselho Nacional de Política Fazendária
(Confaz).
Redução
Um dos
pontos da reforma é a redução das alíquotas interestaduais, com o
fortalecimento da tributação no destino das mercadorias. Alíquotas
interestaduais elevadas como as praticadas hoje na origem – de 7% nos estados
ricos e de 12% nos pobres – dão margem à guerra fiscal. Muitos estados reduzem
essas alíquotas com a finalidade de atrair investidores privados, com a geração
de emprego e renda para a população.
Do ponto
de vista legal, os incentivos só podem ser concedidos com a anuência dos
representantes de todos os estados no Confaz. Com a ausência de uma política
federal que contribuísse para a equalização da vantagem competitiva dos estados
– situação em que, teoricamente, todos seriam igualmente atrativos –, os mais
pobres abriram mão, unilateralmente, de uma parte de suas alíquotas
interestaduais do ICMS para compensar a desvantagem e sediar grandes
empreendimentos.
À medida
que foi aumentando a adesão de mais estados à prática ilegal, a guerra fiscal
foi se esgotando na capacidade de atrair investidores, na avaliação de
especialistas no assunto. O que sobrou para os estados, além da perda de
arrecadação, foi o receio de ver a pendência tornar-se um enorme imbróglio
jurídico. É que, diante das reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal
(STF) quanto à inconstitucionalidade desses incentivos fiscais, o ministro
Gilmar Mendes propôs à Corte a edição de uma súmula vinculante que consolide
esse entendimento.
O STF tem
aguardado uma solução política do Congresso antes de editar a súmula, que teria
efeito devastador sobre os incentivos. Como esse instrumento tem o poder de vincular
toda a administração à decisão, não seriam mais necessárias ações judiciais
para contestar os benefícios concedidos às empresas, que cairiam
automaticamente.
Relator
do projeto de reforma do ICMS na CAE, o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), que
hoje também é líder do governo, observa que a possibilidade de edição da súmula
vinculante é uma espada de Dâmocles sobre os estados e leva as empresas que se
instalaram nessas unidades federativas a tirar “o pé do acelerador” nos
investimentos. Para “desatar esse nó”, segundo o líder, é preciso uma
engenharia política e econômica que contemple os diferentes interesses dos
estados na questão do ICMS.
Obstáculos
Como o
objetivo da reforma é uniformizar as alíquotas interestaduais em torno de 4%, a
discussão conduz invariavelmente a reivindicações de exceções que contemplem
interesses regionais, como os produtos da Zona Franca de Manaus e o gás
boliviano que passa por Mato Grosso do Sul.
Outro
problema é representado pelas perdas que alguns estados passam a ter na chamada
balança interestadual de mercadorias – quando um produto sai de um estado para
outro. Na primeira tentativa de reforma, em 2013, o governo chegou a editar
medida provisória criando dois fundos – um para compensar essas perdas e outro
para melhorar a posição competitiva dos estados com pouca infraestrutura.
Mas o
próprio governo recuou na ocasião, alegando que a reforma tinha sofrido grandes
alterações na CAE, e deixou a medida provisória cair por decurso de prazo no
Congresso. Agora, a recriação desses mecanismos de compensação é proposta por
outra medida provisória - a 683/2015.
Entretanto,
a criação desses fundos é condicionada pela MP à instituição e arrecadação de
multa de regularização cambial sobre ativos mantidos por brasileiros no
exterior. A multa é prevista no PLS 298/2015, de autoria do senador Randolfe
Rodrigues (PSOL-AP), apoiado pela liderança do governo no Senado.
Na
ausência de recursos federais para bancar a reforma do ICMS, como tem admitido
o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, em reunião com lideranças políticas no
Senado, o projeto de Randolfe passou a ser encarado como uma alternativa.
Especialistas estimam de que a regularização desses ativos poderá gerar uma
arrecadação adicional superior a R$ 100 bilhões.
Se o
projeto virar lei, os brasileiros que mantêm recursos e patrimônio no exterior
sem declarar à Receita Federal poderão repatriá-los, sem responder por crimes
de evasão de divisas ou de omissão de informações ao fisco. O Regime Especial
de Regularização Cambial e Tributária, previsto no PLS 298/2015, condiciona a
legalização à comprovação da origem lícita dos recursos.
Substitutivo
apresentado pelo relator na CCJ, Delcídio do Amaral, prevê a regularização por
meio de pagamento da alíquota de 17,5% do Imposto de Renda (IR), mais multa de
100% sobre o imposto apurado – o que significa um encargo total de 35%. Na
versão original, o projeto previa pagamento pela alíquota do IR da pessoa
jurídica ou da pessoa física estabelecida na tabela progressiva, mais multa de
20%.
Destinação
Conforme
o substitutivo, metade dos recursos arrecadados - a parte referente à multa –
será destinada aos dois fundos criados pela MP 683/2015. Para tanto, o Senado
terá de aprovar uma resolução que reduza as alíquotas interestaduais – no caso,
o PRS 1/2015. Outra condicionante para a utilização dos recursos por esses dois
fundos, de acordo com o substitutivo do relator, é a celebração de convênio
entre os estados e o Distrito Federal que discipline os efeitos dos incentivos
da guerra fiscal.
A
assinatura desses convênios, que permitiria a convalidação dos incentivos, é
disciplinada pelo PLS 130/2014-Complementar, de autoria da senadora Lúcia Vânia
(sem partido-GO). Esse projeto aguarda decisão da Câmara dos Deputados, onde
tramita como PLP 54/2015.
A medida
provisória, que poderá ser votado em agosto, tem muitos defensores, como a
senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), e críticos como o senador Cássio
Cunha Lima (PSDB-PB).
Para
Vanessa, a reforma do ICMS ainda não prosperou justamente por falta de uma
política de compensação de perdas na receita de alguns estados com a unificação
da alíquota do imposto em vendas entre os estados. Segundo ela, essa compensação
é assegurada pela MP.
Cássio
Cunha Lima, entretanto, aponta problema na origem dos recursos que comporiam o
fundo: a regularização, mediante tributação, de contas bancárias não declaradas
no exterior. Para o senador, além de criar uma “lavanderia internacional”, a
medida é provisória e aposta em recursos finitos. Assim, a compensação aos
estados jamais seria completa.
Medidas
aprovadas
Mesmo
inconclusa, a reforma do ICMS já tem partes resolvidas pelo Legislativo. Uma
delas é a repartição do imposto do comércio não presencial (internet e
telefone) entre os estados comprador e vendedor. A PEC 07/2015, que deu origem
à Emenda à Constitucional 87, integrou o rol das proposições do pacto
federativo.
A emenda
corrige uma distorção que permitia o recolhimento de todo o ICMS somente pelo
estado onde está a sede da loja virtual. O estado de residência do comprador,
ou de destino da mercadoria, não tinha qualquer participação no imposto
cobrado. Assim, eram beneficiados principalmente os entes da federação mais
desenvolvidos, como São Paulo.
O texto
promulgado é o que foi modificado pela Câmara dos Deputados, tornando gradual a
alteração nas alíquotas e atribuindo aos estados de destino 100% da diferença
de alíquotas apenas em 2019. Até lá, vale a seguinte regra de transição: 20%
para o destino e 80% para a origem, em 2015; 40% para o destino e 60% para a
origem, em 2016; 60% para o destino e 40% para a origem, em 2017; e 80% para o
destino e 20% para a origem, em 2018. Promulgada em 16 de abril, a emenda
altera o parágrafo 2º do artigo 155 da Constituição e inclui o artigo 99 nos Atos
das Disposições Constitucionais Transitórias.
Outro
ponto resolvido pelo Senado decorria da chamada guerra dos portos, uma variante
da guerra fiscal. Estados que sediavam portos marítimos – inclusive portos
secos – reduziam as alíquotas interestaduais sobre produtos importados, para
atrair um maior fluxo de entrada de mercadorias. Uma resolução do Senado – a 13/2012
– unificou em 4% essas alíquotas sobre os importados, para reduzir a margem de
manobra dos estados.
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