Estudo diz que 77% dos cargos de conselheiros de tribunais de contas no Brasil são
ocupados por ex-políticos e seus parentes
‘Transparência Brasil’
mostra que maioria dos conselheiros chega às cortes após exercer mandatos ou
cargos em governos
Movimento de combate à corrupção, da ONG Transparência Brasil, denuncia 'ineficiência' e 'falta de transparência' de tribunais de contas no País. Foto: Agência Estado. |
Daniel Bramatti, José Roberto de Toledo - O Estado
de S. Paulo
Estudo da
ONG Transparência Brasil, entidade
cuja principal bandeira é o combate à corrupção, revela que 62% dos 238
conselheiros de tribunais de contas conquistaram os cargos depois de exercer
mandatos políticos ou posições em governos. Segundo o relatório, os tribunais
são caros, altamente politizados e "desenhados para não funcionar".
Além dos 62% de ex-políticos, cerca de
15% dos integrantes dos tribunais são parentes de algum político local - o que
coloca em questão sua independência para atuar como fiscais da administração
pública. Esse cenário vale tanto para as cortes estaduais quanto para o
Tribunal de Contas da União (TCU), como mostrou recentemente o episódio Gim
Argello (mais informações nesta página).
Nos tribunais de contas pelo País, dois
terços dos integrantes são nomeados pelo Legislativo e um terço pelo Executivo.
"Eles costumam ser indicados justamente para neutralizar o papel
fiscalizador desses órgãos - e, de quebra, para agradar a correligionários,
parentes e aliados", diz o relatório elaborado por Natália Paiva e Juliana
Sakai.
O estudo detectou que dois em cada cinco
conselheiros sofrem processos ou foram condenados na Justiça ou nos próprios
tribunais de contas - até por improbidade administrativa e peculato. Em Goiás,
cinco dos sete conselheiros do TCE têm pendências na Justiça.
Segundo o relatório, as exigências
previstas na Constituição são frouxas. As exigências se restringem a aspectos
formais - ter entre 35 e 70 anos de idade e uma década de experiência
profissional correlata - e a questões subjetivas, como "idoneidade
moral", "reputação ilibada" e "notórios conhecimentos
jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração
pública".
Na prática, os critérios técnicos ficam
em segundo plano. "A indicação política é a regra na escolha de conselheiros,
o que faz com que as votações nas Assembleias, nas Câmaras e no Congresso sejam
jogos de cartas marcadas", diz o estudo.
Os cargos são cobiçados por políticos em
fim de carreira, entre outros pontos, por garantir uma aposentadoria
confortável. "Em geral, o salário é de R$ 26.500, além de gratificações,
verbas de gabinete uniformemente obscuras, prerrogativa de nomear funcionários
comissionados e vitaliciedade no cargo (com aposentadoria compulsória aos 70
anos)."
Contas caras. Os tribunais, que são órgãos auxiliares
do Poder Legislativo, têm uma estrutura tão cara que, em muitos casos, acabam
custando aos cofres públicos quase tanto quanto as Assembleias Legislativas.
No Rio, o orçamento da Assembleia é de R$
682 milhões, enquanto o do TCE chega a R$ 593 milhões. Em outras cinco unidades
da Federação (Amazonas, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul
e Pernambuco), os gastos dos tribunais de contas equivalem a 70% ou mais do
total consumido pelas Assembleias.
Mesmo quando as cortes exercem poder
fiscalizador, raramente as punições se concretizam. "Como os TCs não fazem
parte do Poder Judiciário, o julgamento das contas segue o formato de um
tribunal administrativo, o que provoca impacto sobre a validade de suas decisões."
No caso do TCU, "a relação entre
multas aplicadas e pagas é baixíssima: 4,6% entre 2005 e 2009 e 8,3% entre 2008
e 2010, segundo dados do próprio tribunal". "Pode-se inferir que nos
TCEs e TCMs a efetividade tende a ser ainda mais baixa. O que leva ao
questionamento natural sobre se o dinheiro público investido na manutenção
dessas cortes fortemente politizadas tem o retorno esperado."
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