Em ano de eleição, governo terá pouco espaço para estimular
a economia, diz economistas.
Por outro lado, ‘Brasil deve crescer em 2014 um
pouco mais do que em 2013', disse Delfim Netto
FN Café NEWS
– O ano mal chegou e a polêmica foi suscitada por alguns economistas do País: o Brasil cresce economicamente, ou não, em
2014? Para além da economia, será
também se o Brasil vai ter um desempenho significativo no crescimento em áreas
como a educação e o desenvolvimento social sustentável neste ano? Esta é
outra questão que compete ouvir especialistas desses segmentos do conhecimento.
No entanto, para o momento, lança-se mão de
algumas opiniões na quebra de braço entre economistas brasileiros sobre cenário
e estágio econômico para o Brasil 2014.
Por um lado, sem margem de manobra, segundo
alguns economistas, normalmente a ordem seria aquecer a economia brasileira,
mas Planalto terá de lidar com redução de estímulos nos EUA e desconfiança
externa sobre o Brasil em 2014; perspectiva de mercado é de crescimento de 1,5%
a 2%. Por outro lado, de acordo com Delfim Netto, apontado como um dos
conselheiros econômicos da presidente Dilma Vana Rousseff [o que
ele nega], em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, há chances de a
economia brasileira crescer mais de 2014 do que em 2013. "Hoje, o que
precisa é uma decisão da presidente de fazer 2% de superávit primário, sem
truques", disse Delfim.
Veja a seguir a controvérsia de ideias entre
os economistas.
O Estado de S. Paulo/Luiz Guilherme Gerbelli
O governo
terá de lidar com diversas amarras em 2014, o que dará pouco espaço para
estimular a economia brasileira. A expectativa é que o padrão econômico do País
dos últimos anos se repita com baixo crescimento e inflação elevada.
Se o governo decidir, por exemplo,
aumentar os gastos para estimular a economia, a situação fiscal tende a piorar
ainda mais, e aumenta o risco de o Brasil ser rebaixado pelas agências de risco
num ano de disputa eleitoral - em junho, a agência Standard & Poor's
colocou a perspectiva de rating brasileiro de estável para negativo.
"O desejo do governo seria o de
colocar o pé no acelerador porque 2014 é um ano eleitoral. Mas existe uma
restrição dada pelas agências de risco", afirma Juan Jensen, economista e
sócio da Tendências Consultoria. A estimativa para 2014 é que o Produto Interno
Bruto (PIB) cresça 2,1% e inflação, medida pelo IPCA, fique em 6%.
A inflação, em particular, também tende a
ser um incômodo neste ano por causa da pressão dos preços administrados. Em
2013, esse grupo foi beneficiado pelo congelamento das tarifas dos transportes
e pelo baixo reajuste do combustível. Assim, os administrados devem subir
apenas 1,5% em 2013, nível considerado baixo e que não deve se repetir em 2014.
"A economia está tão amarrada que
desamarrá-la não vai ser fácil. A inflação reprimida está muito alta e, se o
governo liberá-la, o BC terá de subir os juros para impedir um patamar mais
alto da inflação", afirma Armando Castelar, coordenador da área de
economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio
Vargas (Ibre/FGV). Novas altas da taxa básica juros (Selic) podem esfriar ainda
mais a economia brasileira. A expectativa do Ibre é que o PIB cresça 1,8% em
2014, e a inflação fique em 6,1%.
O controle inflacionário também deve ser
dificultado pela normatização da política monetária dos Estados Unidos, o que
trará mais pressão para o câmbio - com a desvalorização do real - e um possível
repasse para os preços. O Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA)
iniciou em dezembro a retirada dos estímulos da economia. Reduziu as compras
mensais de ativos de US$ 85 bilhões para US$ 75 bilhões.
"O fim dos estímulos nos Estados
Unidos diminui a liquidez internacional e complica um pouco o mercado
brasileiro", afirma Jensen. Para ele, o BC está se aproximando do fim do
ciclo de aumento da taxa básica de juros (Selic). Desde abril, os juros subiram
de 7,25% ao ano para 10% ao ano.
Ajuste. Para especialistas, o governo também terá
de trabalhar parra reduzir os desequilíbrios econômicos apresentados em 2013.
Indicadores ruins levaram a uma piora da percepção sobre o Brasil, sobretudo
desde o fim de outubro, quando foi divulgado o déficit de R$ 9 bilhões nas
contas públicas de setembro. A queda de 0,5% no PIB do terceiro trimestre
também piorou o cenário.
O problema é que o governo quer evitar
ajustes que possam prejudicar o crescimento da economia em 2014, por causa da
eleição. "Em 2015, o Brasil vai ter de fazer alguns ajustes na política
econômica, independentemente de quem vença as eleições. Hoje, há incerteza da
magnitude desse ajuste", diz o sócio da Tendências.
Para Castelar, as consequência de um
eventual ajuste seriam redução no reajuste do salário mínimo e alta no
desemprego. "Acho que o governo não quer tocar demais no bem-estar da
população. O custo é tão grande que o governo deve empurrar com a
barriga", diz. Embora afirme que o ajuste terá de ser feito algum dia, o
economista acredita que as reservas internacionais podem ajudar a adiar
mudanças pouco populares.
ENTREVISTA DE DELFIM AO ‘ESTADÃO’
'Brasil deve crescer em 2014 um pouco mais do que em 2013'
Para ex-ministro, País pode ser favorecido por uma mudança na postura do governo em relação à gestão da economia
Luiz Guilherme Gerbelli - O Estado de
S.Paulo
O ex-ministro Delfim Netto acredita que o
governo brasileiro melhorou o diálogo com a iniciativa privada e que está nas
mãos da gestão Dilma Rousseff evitar o ele que chamou de tempestade perfeita.
Para Delfim, apontado como um dos conselheiros econômicos da presidente - o que
ele nega- , há chances de a economia brasileira crescer mais de 2014 do que em
2013. "Hoje, o que precisa é uma decisão da presidente de fazer 2% de
superávit primário, sem truques", disse. A seguir trechos da entrevista
concedida ao Estado.
ESTADÃO – O problema na economia
brasileira é real ou é um problema de imagem por causa das manobras que foram
feitas no passado?
DELFIM NETTO - Houve uma manobra realmente devastadora:
a quadrangulação (envolvendo Petrobrás, Fundo Soberano, BNDES e Caixa
Econômica) no fim de 2012 (o governo só fechou a conta de 2012 com essa
manobra). Ela revelou tanta imaginação que apavorou os analistas. Não estamos
diante do apocalipse. Uns 60% de dívida bruta é desagradável, mas não é um
risco. Ela é desconfortável porque, se amanhã você precisar usar política
anticíclica, não tem mais espaço. As medidas foram minando a credibilidade.
Depois houve outro problema sério: a perspectiva, no Congresso, de que haveria
aumento de despesas era muito séria e grave. Nisso o governo deu um passo
importante ao fazer um acordo com o Congresso. Pelo menos em 2013 e em 2014 não
serão colocados em pauta projetos que aumentem despesas e reduza receita.
ESTADÃO – O acordo é tão importante?
DELFIM NETTO - A perspectiva (de desequilíbrio nas
contas), não do presente, mas do futuro, criou uma dúvida nas agências risco.
Há possibilidade de um rebaixamento de um rating ou um ponto (na nota de
crédito do Brasil). Eu creio que não haverá mudança no nível de investimento,
mas o rebaixamento já será uma coisa grave. O risco maior é a combinação disso
com a redução dos estímulos americanos. Eu acho que o governo entendeu e está
fazendo o que é necessário para reverter essa crença. Hoje, o que precisa é uma
decisão da presidente de fazer 2% de superávit primário, sem truques. E, na
minha opinião, isso é mais do que suficiente para estabilizar a dívida bruta.
E, quando recuperar o crescimento, ela vai reduzir-se naturalmente.
ESTADÃO – Está claro para o sr. que o
governo já tomou a decisão de acalmar o mercado?
DELFIM NETTO - O governo incorporou a ideia de que está
na sua mão evitar a tempestade perfeita. Em relação a política monetária
americana, não temos nenhuma influência, mas sobre a política fiscal brasileira
temos.
Quais são os sinais de mudança do
governo?
ESTADÃO – DELFIM NETTO - São muitos. Primeiro, nas relações com o
setor privado. Havia uma dúvida muito séria no programa de concessões. O
governo passou a ouvir mais e tem tido mais sucesso. Eu acho que está se
dissipando a ideia de que o governo é contra o setor privado, mas mais
lentamente do que gostaria. Agora, estamos vivendo com uma redução no nível de
crescimento. Isso aconteceu no mundo inteiro. No nosso caso, eu acho que é um
pouco mais porque, aos erros do mundo, nós acrescentamos os nossos próprios
erros. Mas, na minha opinião, 2014 vai ser um pouco melhor do que 2013.
ESTADÃO – Por que o Brasil cresce tão pouco
no governo Dilma?
DELFIM NETTO - O Brasil praticamente atingiu o pleno
emprego. Nesse caso, quanto pode crescer a mão de obra no futuro? 1% ao ano?
Para um País crescer 4%, quando a população cresce 1%, a produtividade tem de
crescer 3%. Mas é preciso dar muito mais capital humano e físico para o
trabalhador. Ou seja, ele precisa de um pouco mais de saúde, de educação. Há
também a destruição da indústria, que não é um acidente. Foi um erro de
política econômica. Ampliaram os salários nominais muito acima da produtividade
física do trabalho e usaram a taxa de juros - a maior do mundo - para valorizar
o câmbio nominal. De 2002 a 2008, tinha um excedente de exportação de
manufaturados de US$ 120 bilhões. Depois, virou um déficit de uns US$ 170
bilhões. Ou seja, na verdade, a valorização do câmbio roubou quase US$ 300
bilhões de dólares de demanda do setor industrial. Se o sujeito, diante desse
roubou, decide investir, é um idiota. A indústria foi roubada duas vezes.
Primeiro, a valorização do câmbio foi cortando a exportação, depois, ela foi se
acentuado e, também, foi cortando o mercado interno.
ESTADÃO – Como se resolve isso?
DELFIM NETTO - Está sendo resolvido. O juro nunca mais
voltar ao nível que era - não precisa de juro real a 10%. E o câmbio está
melhor. Só que a resposta do setor industrial leva 12, 18 meses. Lentamente
esses efeitos vão surgir. Há também uma compreensão do governo de que é preciso
transferir para o setor privado as obras de infraestrutura em forma de PPP
(Parceria Público Privada) ou concessão, porque é evidente que o Estado não tem
recursos e competência para fazer isso. De fato, eu acho que não só o governo
aprendeu, mas as condições objetivas melhoraram. O Brasil deve crescer em 2014
um pouco mais do que 2013.
ESTADÃO – O senhor tem falado com a presidente
Dilma?
DELFIM NETTO - Isso é um mito, é história. Eu tenho,
sim, uma simpatia (pela Dilma) porque eu acho que ela tem qualidades muito
interessantes que podem ser usadas no desenvolvimento econômico por isso que eu
fico lutando para que haja um entendimento melhor entre o setor privado e o
governo. Só a coordenação dos dois é que pode produzir o desenvolvimento. Como
acho que a probabilidade de reeleição dela supera os 50%, a minha tendência é
dizer: o jeito é nós usarmos a Dilma. Ninguém sabe tanto quanto ela que existem
coisas invioláveis, e uma delas é a contabilidade nacional. Dilma foi vítima de
um curso de economia (risos). Existem limitações. Cada vez que alguém tentar
violar (a contabilidade nacional), vai dar com os burros n'água porque não vai
conseguir e só vai ter problemas.
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