Panorama visto da ponte
A eleição de outubro caminha mesmo para o embate Lula versus Bolsonaro
Por Luis Felipe Miguel*
Já para Bolsonaro, o melhor caminho seria talvez desistir de uma reeleição improvável e tentar um mandato parlamentar pelo Rio de Janeiro, garantindo imunidade. Mas tal passo é contraditório com a persona política que ele criou e com a manutenção de sua base fanatizada (além de exigir a desincompatibilização do cargo). Deve, portanto, seguir o caminho de Trump: tumultuar o processo ao máximo, apostar em manobras de alto risco e manter, sempre, uma alta capacidade de disrupção, a fim de inibir medidas legais contra ele por parte de um futuro governo democrático.
João Doria sabe que suas chances na eleição são próximas de zero. Mas mantém sua candidatura para permanecer como dono do espólio do PSDB. Imagino que priorizará a campanha de Rodrigo Garcia em São Paulo – uma disputa difícil, ainda que o vice-governador seja o maior beneficiado em potencial com a retirada da candidatura de Alckmin. Para Doria, além de tudo, a vitória em SP pode ser inócua. Como ele mesmo tão bem exemplifica, apadrinhamento hoje não garante lealdade amanhã.
Ciro Gomes finalmente percebeu que não vai seduzir a centro-direita e tenta mais um reposicionamento de marca, novamente na centro-esquerda. Mas é improvável que consiga avançar. Seu comportamento errático e oportunista de 2018 para cá gerou ressentimentos profundos. E, apesar do marketing competente, ele não consegue deixar de ser notícia velha. Se fosse mais racional, estaria hoje negociando um apoio a Lula. Não o sendo, é provável que 2022 seja, para ele, o que 2018 foi para Marina Silva: o fim da linha.
O PSOL dificilmente lançará candidatura própria, mesmo com os acenos cada vez mais explícitos do PT por uma composição com a direita. Caso lance, será difícil ter tração para influenciar o debate, ficando mais próximo do nicho das candidaturas simbólicas da esquerda (PSTU, talvez PCB ou UP) do que do núcleo da disputa real.
Com as principais candidaturas presidenciais de outsiders (Huck, Datena etc.) descartadas já no ano passado, parece que a eleição de outubro se configurará mesmo como um embate Lula versus Bolsonaro.
*Professor de Ciência Política pelo Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). É doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Em março de 2018, ele lançou pela Boitempo o livro "Dominação e resistência: desafios para uma política emancipatória”.
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