A
razão real que os inimigos de Dilma Rousseff querem seu impeachment
Por David Miranda/The Guardian
Presidente Dilma Rousseff (PT), que teve seu processo de impeachment admitido pela Câmara dos Deputados no último domingo (17/4). Foto: : Fernando Bizerra/EPA |
LONDRES (UK) - A história da crise
política no Brasil, e a mudança rápida da perspectiva global em torno dela,
começa pela sua mídia nacional. A imprensa e as emissoras de TV dominantes no
país estão nas mãos de um pequeno grupo de famílias, entre as mais ricas do
Brasil, e são claramente conservadoras. Por décadas, esses meios de comunicação
têm sido usados em favor dos ricos brasileiros, assegurando que a grande
desigualdade social (e a irregularidade política que a causa) permanecesse a
mesma.
Aliás, a maioria dos grandes
grupos de mídia atuais – que aparentam ser respeitáveis para quem é de fora –
apoiaram o golpe militar de 1964 que trouxe duas décadas de uma ditadura de
direita e enriqueceu ainda mais as oligarquias do país. Esse evento histórico
chave ainda joga uma sombra sobre a identidade e política do país. Essas
corporações – lideradas pelos múltiplos braços midiáticos das Organizações
Globo – anunciaram o golpe como um ataque nobre à corrupção de um governo
progressista democraticamente eleito. Soa familiar?
Por um ano, esses mesmos
grupos midiáticos têm vendido uma narrativa atraente: uma população
insatisfeita, impulsionada pela fúria contra um governo corrupto, se organiza e
demanda a derrubada da primeira presidente mulher do Brasil, Dilma
Rousseff, e do Partido dos Trabalhadores (PT). O mundo viu inúmeras imagens de
grandes multidões protestando nas ruas, uma visão sempre inspiradora.
Mas o que muitos fora do
Brasil não viram foi que a mídia plutocrática do país gastou meses incitando
esses protestos (enquanto pretendia apenas “cobri-los”). Os manifestantes não
representavam nem de longe a população do Brasil. Ao contrário, eles eram
desproporcionalmente brancos e ricos: as mesmas pessoas que se opuseram ao PT e
seus programas de combate à pobreza por duas décadas.
Aos poucos, o resto do
mundo começou a ver além da caricatura simples e bidimensional criada pela
imprensa local, e a reconhecer quem obterá o poder uma vez que Rousseff seja
derrubada. Agora tornou-se claro que a corrupção não é a razão de todo o
esforço para retirar do cargo a presidente reeleita do Brasil; na verdade, a
corrupção é apenas o pretexto.
O partido de Dilma, de
centro-esquerda, conseguiu a presidência pela primeira vez em 2002, quando seu
antecessor, Lula da Silva, obteve uma vitória espetacular. Graças a sua
popularidade e carisma, e reforçada pela grande expansão econômica do Brasil
durante seu mandato na presidência, o PT ganhou quatro eleições presidenciais
seguidas – incluindo a vitória de Dilma em 2010 e, apenas 18 meses atrás, sua
reeleição com 54 milhões de votos.