77 milhões no País não têm água
regularmente e de qualidade, diz ONU
Informe da Organização das Nações Unidas adverte ainda que
114 mi não têm solução sanitária apropriada e que 8 mi são obrigados a fazer
necessidades ao ar livre
No Norte, 31% da população ainda vive "sem um fornecimento adequado de água" e no Nordeste, essa taxa chega a 21,5%. Foto: Agência Estado. |
Jamil Chade - Corresponde de O Estado de S. Paulo
GENEBRA
- Um abastecimento de água regular e de qualidade ainda é uma realidade
distante para 77 milhões de brasileiros, uma população equivalente a todos os
habitantes da Alemanha. O alerta é da Organização das Nações Unidas (ONU), que
ainda aponta que 60% da população - 114 milhões de pessoas - "não tem uma
solução sanitária apropriada". Os dados ainda revelam que 8 milhões de
brasileiros ainda precisam fazer suas necessidades ao ar livre todos os dias.
O
informe que traz esses dados foi preparado pela relatora da ONU, Catarina de
Albuquerque, que não hesita em alertar que o crescimento econômico dos últimos
anos ainda não se traduziu em uma melhora em termos de acesso à água no País.
O jornal Estado de S. Paulo revelou em junho de 2013 que a representante das Nações Unidas teve sua
primeira inspeção para realizar o levantamento vetada pelo governo. A visita
estava programada para ocorrer em julho do ano passado. "O governo apenas
explicou que, por motivos imprevistos, a missão não poderia mais ocorrer",
declarou na época Catarina de Albuquerque.
Internamente,
a ONU considerou que o veto tinha uma relação direta com os protestos que, em
2013, marcaram as cidades brasileiras. A viagem só aconteceria em dezembro de
2013, o que impediria que o informe produzido fosse apresentado aos demais
governos da ONU e à sociedade civil antes da Copa do Mundo.
Agora,
o raio X reflete uma crise que vive o País no que se refere ao acesso à água e
saneamento. "Milhões de pessoas continuam e viver em ambientes insalubres,
sem acesso à água e saneamento", indicou o informe, apontando que o maior
problema estaria nas favelas e nas zonas rurais.
Albuquerque
deixa claro que o crescimento da economia brasileira nos últimos anos não foi
traduzida em ganhos nesse setor. "Nos últimos anos, o Brasil experimentou
um desenvolvimento significativo, com crescimento econômico e uma melhoria dos
indicadores sociais. Mas esses ganhos ainda não foram refletidos nos serviços de
água e saneamento", alertou.
Segundo
a ONU, o baixo investimento em saneamento no Brasil está tendo "custos
elevados para a saúde público". Em apenas um ano, 400 mil pessoas teriam
sido internadas no país por diarreia, com um custo para o Serviço Único de
Saúde (SUS) de R$ 140 milhões. O informe aponta que, para cada dólar que fosse
investido em saneamento no Brasil, o retorno seria de US$ 5 em custos evitados
e ganhos de produtividade.
As
diferenças regionais são profundos. No Norte, 31% da população ainda vive
"sem um fornecimento adequado de água". No Nordeste, essa taxa chega
a 21,5%. Um dos aspectos mais graves, segundo a entidade, é a
"privação de água e saneamento" nas favelas. "O direito à água não
pode ser negado a ninguém com base no status legal de sua moradia",
alertou a relatora. Para ele, nem o governo e nem os provedores dos serviços
tem o direito de negar o abastecimento.
Teto. O abastecimento também tem uma relação direta
com a renda dos habitantes de uma região. "Em locais onde a população
ganha um quarto de um salário mínimo, o déficit de água é de 35%", indicou
a ONU. Em locais onde a renda é de cinco salários mínimos, 95% da população tem
acesso adequada ao abastecimento de água."O Brasil tem ainda um longo
caminho para garantir acesso universal a esse direito (abastecimento de
água)", afirmou a ONU.
Para
contornar esse problema, a ONU sugere um teto para o preço da água e alerta que
os padrões internacionais apontam que o abastecimento não pode representar mais
que 5% do orçamento de uma família. Em sua visita ao Brasil, porém, Albuquerque
relatou que chegou a encontrar famílias que chegavam a gastar 25% de sua renda
com os serviços de água e saneamento.
"A
relatora considera que é urgente uma determinação vinculante, no nível federal,
de um porcentual máximo do orçamento de uma família para pagar pelo
abastecimento de água e saneamento", indicou o informe.
A
ONU ainda alerta que o governo federal precisa rever seus objetivos. Segundo o
levantamento, o Plano Nacional de Saneamento não atende os mais necessitados. A
meta do programa é de atender 99% da população com o abastecimento de água até
o ano de 2033. "O Plano não tem como meta uma cobertura universal,
deixando 1% da população sem acesso à água e 8% sem saneamento", alertou.
"Isso vai provavelmente levar à exclusão dos mais pobres e mais
vulneráveis."
Entre
as recomendações, a ONU pede que o Brasil faça uma emenda à Constituição para
tornar o direito à água em uma garantia constitucional. Outra proposta é de que
empresas que fazem o abastecimento usem parte de seus ganhos nas bolsas para
ampliar sua rede de serviços.
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