quarta-feira, 20 de junho de 2018

DESUMANIDADE: crianças engaioladas nos EUA...

Sobre a tal humanidade
Por Luis Felipe Miguel*
Governo Trump nos EUA coloca crianças em gaiolas.
Foto: Agências de notícias
Trump não esconde suas políticas desumanas, que culminam, agora, com sua prisão de bebês. Pelo contrário, faz questão de alardeá-las. Aquilo que nós percebemos como uma selvajaria inominável, indesculpável, transita entre o público dele como uma demonstração de "macheza". O cerne desta macheza é a absoluta insensibilidade à dor dos outros, que prova que estes outros estão sendo construídos como Outro absoluto, a quem a humanidade é negada. A política desumana seria a única apropriada a quem não é considerado humano.

É o mesmo mecanismo que vemos em ação quando alguém aplaude Bolsonaro e sua apologia à tortura. Ou o massacre de famílias palestinas pelo Estado de Israel. Como é possível que esta identificação com a brutalidade esteja tão presente?

Não creio que seja um traço da "natureza humana", até porque tendo a concordar com o que disse um grande pensador: não existe natureza humana fora da sociedade humana. Temos que investigar é o que abre espaço para isso nas nossas sociedades.

E, claro, temos que combater este discurso como se fosse nosso pior inimigo - aliás, ele é mesmo nosso pior inimigo. Outro dia esbarrei num vídeo, não lembro de quem, que "ilustrava" as falas de Bolsonaro. O ex-capitão dizia que o Brasil precisava de um guerra civil, o vídeo mostrava cenas de guerra civil. Ele dizia que a morte de inocentes era o preço necessário a pagar pela limpeza do pais, o vídeo mostrava imagens de crianças de colo atingidas por bombardeios. Ele defendia a tortura, vinha o depoimento de uma sobrevivente dos porões da ditadura contando o que foi infligido a ela e a seus filhos pequenos.

É a aposta de que esse discurso "pega" também porque, para a maior parte de seus seguidores, é uma abstração. Quando ganha concretude, seu horror se torna visível. É a crença de que o choro dos bebês aprisionados por Trump vai tocar quem até agora apoia suas atrocidades. Dá certo? Não sei. Gosto de imaginar que sim, que mesmo nas piores circunstâncias o sentimento de nossa humanidade comum sobrevive e pode ser alcançado.

*Luis Felipe Miguel é Doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, Professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, onde coordena o Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades. Pesquisador do CNPq. Autor de diversos livros, entre eles Democracia e representação: territórios em disputa (Editora Unesp, 2014), Feminismo e política: uma introdução (com Flávia Biroli; Boitempo, 2014), Dominação e resistência: desafios para uma política emancipatória (Boitempo, 2018).


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sinta-se à vontade para postar seu comentário.
Espaço aberto à participação [opinião] e sujeito à moderação em eventuais comentários despretensiosos de um espírito de civilidade e de democracia.
Obrigado pela sua participação.
FN Café NEWS

FATOS DA SEMANA

Mapa Geopolítico do Rio São Francisco

Mapa Geopolítico do Rio São Francisco
Caracterização do Velho Chico

Vocé é favorável à Transposição do Rio São Francisco?

FN Café NEWS: retrospectiva